Daniel Dunglas Home nasceu em 1833 em Currie, uma aldeia perto de Edimburgo.
Havia um mistério relativamente à sua ascendência: tanto se afirmava, quanto se negava que fosse, de certo modo, da família do Conde de Home. Na verdade foi um homem que herdou um tipo elegante, maneiras delicadas, disposição sensível e um gosto para o luxo, fosse de que fonte fosse. Mas pela sua força psíquica e pelo entusiasmo que esta comunicou ao seu caráter complexo, ele podia ser realmente tomado como o tipo exato de um caçula aristocrata, que herda as tendências, mas não a riqueza dos pais.
Home saiu da Escócia para a Nova Inglaterra aos nove anos de idade, com uma tia que o havia adotado, outro mistério que lhe cercava a existência. Aos treze anos de idade começou a mostrar as faculdades psíquicas herdadas de sua mãe, descendente de velha família de Highland e que possuía a faculdade de previsão característica de sua raça. Sua tendência mística revelou-se numa conversa com um colega, chamado Edwin, acerca de uma história, na qual fora feito um pacto em consequência do qual a criatura amada mostrar-se-ia à outra depois da morte. Do mesmo modo os dois rapazes fizeram o pacto de se mostrar um ao outro. Home mudou-se para outro distrito, a algumas milhas de distância e, um mês mais tarde, certa noite, assim que foi para a cama, teve a visão de Edwin e anunciou à sua tia a morte do rapaz, do que tiveram informação um ou dois dias depois. Uma segunda visão, em 1850, referia-se à morte de sua mãe, que tinha ido com o marido viver na América. Nessa ocasião o rapaz se achava acamado e sua mãe se achava fora, em visita a amigos distantes.
Uma noite ele gritou por socorro e quando a tia chegou encontrou-o muito abatido.
Disse que a mãe havia morrido naquele dia às doze horas; que ela lhe havia aparecido e dado aviso. Em breve batidas fortes começaram a perturbar aquele lar quieto e os móveis a serem arrastados por forças invisíveis. Sua tia, criatura de estreita visão religiosa, disse que o rapaz havia trazido o Diabo para casa e jogou-o na rua.
Ele refugiou-se com os amigos e nos anos seguintes passava da casa de um para a de outro, de cidade em cidade. Sua mediunidade se havia desenvolvido poderosamente e nas casas em que se hospedava realizava frequentes sessões, às vezes seis ou sete por dia, pois as limitações da força e as reações entre o físico e o psíquico eram então mal compreendidas.
Isto lhe produzia grande perda de forças, e frequentemente o levava para a cama.
Multidões acorriam de todos os lados para presenciar as maravilhas que se produziam na presença de Home. Entre os que então investigaram com ele estava o poeta americano Bryant, que era acompanhado pelo Professor Wells, da Universidade de Harvard. Em New York encontrou muitos americanos distintos, dos quais três fizeram sessões com ele: o Professor Hare, o Professor Mapes e o Juiz Edmonds, da Suprema Corte de New York. Estes três, como ficou dito, tornaram-se espiritistas convictos.
Nesses primeiros anos o encanto da personalidade de Home e a profunda impressão criada por sua força permitiram que recebesse muitas ofertas. O Professor George Bush convidou-o para sua companhia, a fim de estudar para ministro swedenborgiano; Mr. e Mrs. Elmer, um rico casal sem filhos, que lhe haviam tomado grande afeição, ofereceram-se para adotá-lo e fazê-lo seu herdeiro, com a condição de trocar o nome pelo de Elmer.
Seu notável poder curador tinha excitado a admiração e, persuadido pelos amigos, começou a estudar medicina. Mas a sua saúde delicada, complicada com uma afecção pulmonar, forçou-o a abandonar os seus planos e, a conselho médico, deixou New York e foi para a Inglaterra.
Chegou a Liverpool a 9 de abril de 1855, e foi descrito como um jovem alto, esguio, de marcada elegância e exagerada limpeza do vestir, mas com um olhar típico e uma expressão que traía a devastação feita pela moléstia. Tinha os olhos azuis e os cabelos castanhos; era desse tipo facilmente sujeito a tuberculose e a extrema emaciação mostrava quanto era insignificante a sua capacidade de resistência. Um médico, bom observador, certamente lhe faria um prognóstico de apenas uns meses de vida, num clima úmido como o nosso e de todas as maravilhas que Home realizava, o prolongamento da sua vida certamente não foi das menores. Seu caráter já havia tomado aqueles traços emocionais e religiosos que o distinguiam e ele recordou como, antes de desembarcar, correu para o seu camarote e ajoelhou-se em prece. Quando a gente considera a admirável carreira que se abre à sua frente e o grande papel que ele desempenhou no estabelecimento das bases materiais que diferenciam esse movimento religioso de qualquer outro, pode-se proclamar que esse visitante estava entre os mais notáveis missionários que jamais apareceram por estas plagas.
No momento a sua posição era muito singular. Tinha uma relação difícil com o mundo.
Seu pulmão esquerdo estava parcialmente destruído. Seus recursos eram modestos, embora suficientes. Não tinha negócios nem profissão e sua educação havia sido interrompida pela doença. De caráter desconfiado, gentil, sentimental, artístico, afetuoso e profundamente religioso, tinha uma profunda tendência para a Arte e para o Drama. Assim, a sua capacidade para a escultura era considerável e como declamador provou mais tarde que pouca gente o igualava. Mas acima de tudo isto, de uma honestidade inflexível e tão rigorosa que por vezes chegava a ofender aos seus aliados, havia um dom tão admirável que apagava todos os demais. Este repousa naquelas forças, muito independentes de sua vontade, que iam e vinham com desconcertante subtaneidade, mas demonstrando a todos que examinassem a prova, que havia algo na atmosfera desse homem que permitia que as forças a ele exteriores, como exteriores à nossa percepção, se manifestassem neste plano da matéria. Por outras palavras, ele era um médium – o maior que o mundo moderno já viu, no campo das manifestações físicas.
Um homem inferior teria usado os seus poderes extraordinários para fundar uma seita especial, da qual teria sido o sumo sacerdote inconteste, ou para se rodear de uma auréola de poder e de mistério. Certamente muita gente na sua posição teria sido tentada a usar aqueles dons para fazer dinheiro. Em relação a este ponto seja dito, antes de tudo, que no curso de seus trinta anos de estranho ministério, jamais ele tocou num tostão como paga de seus dons. É absolutamente certo que lhe foram oferecidas duas mil libras pelo Clube União, em Paris, no ano de 1857, por uma única sessão, e que ele, pobre e inválido, as recusou terminantemente. “Fui mandado em missão”, disse ele. “Essa missão é demonstrar a imortalidade. Nunca recebi dinheiro por isso e jamais o receberei”. Houve certos presentes da Realeza que não podiam ser recusados sem grosseria: anéis, alfinetes de gravatas e outros, que mais eram sinais de amizade do que recompensa; porque, antes de sua morte prematura, poucos eram os monarcas da Europa com os quais esse moço desconfiado de um subúrbio de Liverpool não estivesse em afetuosa intimidade. Napoleão 3º cuidou de sua única irmã; o Imperador da Rússia foi testemunha de seu casamento. Qual o novelista que seria capaz de inventar uma tal carreira?
Há, porém, tentações mais sutis do que as da riqueza. A inquestionável honestidade de Home foi a melhor salvaguarda contra aquelas. Jamais ele perdeu, por um só instante, a sua humildade e o seu senso de proporção. “Tenho esses poderes”, teria ele dito, “serei feliz até o limite de minhas forças, eu vo-los demonstrar, se vos aproximardes de mim, do mesmo modo que um cavalheiro se aproximaria de outro. Alegrar-me-ei se lançardes um pouco mais de luz sobre elas. Prestar-me-ei a qualquer experiência razoável. Eu não exerço controle sobre elas. Elas me usam, mas eu não as uso. Elas me abandonam durante meses e voltam com redobrada energia. Eu sou um instrumento passivo – nada mais.” Tal era a sua atitude invariável. Ele era sempre o homem mundano fácil e amigo, que nem tinha o manto do profeta nem o turbante do mágico. Como os homens realmente grandes, não havia em sua natureza o mínimo de pose. Um indício de sua elegância é que, sempre que devia confirmar os seus resultados, jamais citava nomes, a menos que estivesse absolutamente certo de que as pessoas citadas de modo algum se incomodariam em ser referidas a um culto impopular. Por vezes, ainda quando estas lhe houvessem autorizado a citá-las, evitava fazê-lo, com receio de ofender a um amigo. Quando publicou as primeiras séries dos “Incidentes em minha Vida”, o Saturday Review cobriu de sarcasmos o anônimo “Testemunho da Condessa O... do Conde B... do Conde de K... da Princesa de B... e de Mrs. E... que eram apontados como tendo assistido às manifestações. Em seu segundo volume, tendo-se assegurado do apoio de seus amigos, Home preencheu os claros com os nomes da Condessa Orsini, do Conde de Beaumont, do Conde de Komar, da Princesa de Beauveau e a conhecida dama americana Mrs. Henry Senior. Jamais citou os seus amigos reais, embora fosse muito sabido que o Imperador Napoleão e Imperatriz Eugênia, o Czar Alexandre, o Imperador Guilherme 1º da Alemanha e os Reis da Baviera e do Wurtemberg também haviam sido convencidos por suas forças extraordinárias. Nem uma só vez Home foi condenado por qualquer mistificação, quer por palavras, quer por atos.
Por ocasião de sua primeira viagem à Inglaterra, hospedou-se no Cox’s Hotel, em Jermyn Street, e é provável que tenha escolhido essa hospedaria por ter sabido, através de Mrs. Hayden, que o seu proprietário era simpático à causa. Como quer que seja, Mr. Cox logo descobriu que o seu jovem hóspede era o mais notável médium e, a seu convite, os mais notáveis intelectuais do momento foram convidados a examinar os fenômenos que Home lhes poderia exibir. Entre outros, Lord Brougham veio à sessão e trouxe um cientista seu amigo, Sir David Brewster. Em plena luz do dia investigaram os fenômenos e na sua satisfação pelo que se havia passado, ao que se conta, teria dito Brewster: “Isto derrota a filosofia de cinqüenta anos”. Se ele tivesse dito “mil e quinhentos” ter-se-ia aproximado da marca. Ele descreve o que aconteceu numa carta à sua irmã, só muito mais tarde publicada.
Estavam presentes Lord Brougham, Sir David Brewster, Mr. Cox e o médium.
“Nós quatro”, disse Brewster, “sentamo-nos a uma mesa de tamanho regular, e cuja estrutura nos tinham convidado a examinar. Em pouco tempo a mesa fez esforços e um tremor percorreu os nossos braços; esses movimentos cessavam e recomeçavam ao nosso comando. As mais incontáveis batidas se produziram em várias partes da mesa e esta se ergueu do chão quando não havia mãos sobre ela. Outra mesa maior foi utilizada e produziu os mesmos movimentos.
“Uma pequena sineta foi posta no chão, sobre o tapete, de boca para baixo; depois de algum tempo ela soou sem que ninguém a tivesse tocado.”
Acrescenta ele que a sineta veio para ele e se colocou em suas mãos; depois fez o mesmo com Lord Brougham. E conclui: “Estas foram as principais experiências. Não poderíamos explicá-las nem imaginar por que espécie de mecanismo poderiam ter sido produzidas.”
Declara o Conde de Dunraven que foi levado a investigar os fenômenos pelo que Brewster lhe havia contado. Descreve o encontro com este último, que dizia serem as manifestações inexplicáveis pela fraude, ou por quaisquer leis de física de nosso conhecimento. Home remeteu uma descrição dessa sessão a um amigo na América, onde a mesma foi publicada e comentada. Quando os comentários foram reproduzidos na imprensa inglesa, Brewster ficou muito alarmado. Uma coisa é sustentar certas idéias na intimidade e outra enfrentar a inevitável perda de prestígio, que ocorreria nos meios científicos em que se achava. Sir David não era daquele estofo de que são feitos os mártires e os pioneiros.
Escreveu ao Morning Advertiser, declarando que, embora tivesse visto vários efeitos mecânicos que não poderia explicar, ainda era de opinião que os mesmos poderiam ser produzidos por pés e mãos humanos. Aliás jamais lhe ocorrera que a carta escrita à sua irmã, a que acima nos referimos, um dia fosse publicada.
Quando toda a correspondência foi publicada, o Spectator observou, em relação a Sir David Brewster:
“Parece estabelecido pela mais clara prova que ele sentiu e descreveu, logo depois de suas sessões com Mr. Home, uma maravilha e quase terror, que depois desejou explicar. O herói da ciência não se absolve como a gente desejaria, ou como era de esperar.”
Abordamos ligeiramente o incidente com Brewster porque é típico da atitude científica de então e porque o seu efeito era despertar um maior interesse em Home e seus fenômenos, e acordar novos investigadores. Pode alguém lembrar que os homens de ciência se dividem em três classes: os que absolutamente não examinaram o assunto – o que não os impede de pronunciar opiniões muito violentas; os que sabem que a coisa é verdadeira, mas temem confessá-lo; e, finalmente, a brilhante minoria dos Lodges, dos Crookes, dos Barretts e dos Lombrosos, que sabem que é verdade e não temem proclamá-lo.
De Jermyn Street, Home foi morar com a família Rymer, em Ealing, onde foram realizadas muitas sessões. Aí foi visitado por Lord Lytton, o famoso novelista que, muito embora tivesse recebido notáveis provas, jamais confessou publicamente a sua crença nos poderes do médium, a despeito de suas cartas particulares e das novelas publicadas constituírem provas evidentes de seu modo de sentir. Assim acontecia com muitos homens e senhoras bem conhecidos. Entre os seus primeiros assistentes estavam o Socialista Robert Owen, o escritor T. A. Trollope e o alienista Doutor J. Garth Wilkinson.
Nestes dias, quando os fenômenos psíquicos são familiares a todos, exceto aos que propositadamente os ignoram, dificilmente podemos imaginar a coragem moral necessária a Home para desenvolver as suas forças e as exibir em público. Para o britânico de educação média na material época Vitoriana, um homem que se dissesse capaz de produzir fenômenos que contrariassem a lei da gravidade de Newton e que mostrasse uma inteligência invisível atuando sobre a matéria visível era, de saída, julgado um tratante e um impostor. O ponto de vista sobre o Espiritismo, externado pelo vice-chanceler Giffard, na conclusão do processo Home-Lyon, era o da classe a que ele pertencia. Nada conhecia sobre o assunto, mas tomou como certo que tudo nesse particular era falso. É verdade que semelhantes coisas eram descritas em terras distantes e em livros antigos, mas que elas pudessem ocorrer na velha e sólida Inglaterra prosaica, na Inglaterra de dividendos bancários e de livre câmbio, era demasiadamente absurdo para uma mentalidade séria. Foi lembrado que nesse processo Lord Giffard virou-se para o advogado de Home e perguntou: “Parece-me que o senhor sustenta que o seu cliente foi levitado no ar?” O advogado o confirmou e então o juiz voltou-se para o júri e fez um tal movimento, como o teria feito um sumo sacerdote, rasgando suas vestes talares em sinal de protesto contra a blasfêmia. Em 1868, havia poucas pessoas do júri suficientemente educadas para verificar as observações do juiz, e é exatamente neste particular que fizemos algum progresso nestes cinqüenta anos. Trabalho lento – mas o Cristianismo levou mais de três séculos para se firmar.
Tome-se este caso de levitação de Home como um teste de seu poder. Sustenta-se que por mais de cem vezes, perante testemunhas respeitáveis, ele flutuou no ar. Considere-se a prova. Em 1857, num castelo perto de Bordéos, ele foi erguido até o teto de um salão alto, em presença de Madame Ducos, viúva do Ministro da Marinha e do Conde e da Condessa de Beaumont. Em 1860 Robert Bell escreveu um artigo, no Cornhill, sob o título de “Mais estranho do que uma ficção”, no qual diz que “foi erguido de sua cadeira quatro a cinco pés do solo... Vimos o seu corpo passar de um para o outro lado da janela, com os pés para frente, posto horizontalmente no ar”. O Doutor Gully, de Malvern, médico muito conhecido, e Robert Chambers, autor e editor, eram outras testemunhas. Pode-se admitir que esses homens mentissem por deliberado acordo ou que não soubessem dizer se um homem flutuava no ar ou apenas pretendia fazê-lo?
No mesmo ano Home foi levantado em casa de Mis. Milner Gibson, em presença de Lord e Lady Clarence Paget, tendo o Lord passado as mãos por baixo de Home, a fim de se certificar do fato. Poucos meses mais tarde, Mr. Wason, advogado de Liverpool, com sete outros, assistiram ao mesmo fenômeno. Diz ele:
“Mr. Home atravessou a mesa, passando por cima das cabeças das pessoas sentadas em sua volta”. E acrescenta: “Alcancei a sua mão a sete pés do solo e dei cinco ou seis passos enquanto ele flutuava no espaço, acima de mim.” Em 1861 Mrs. Parkes, de Cornwald Terrace, Regent’s Park, conta como se achava presente, com Bulwer Lytton e Mr. Hall, quando Home, em sua própria sala de visitas, foi levantado até que a mão chegou ao alto da porta e então flutuou horizontalmente. Em 1866 Mr. e Mrs. Hall, Lady Dunsany e Mrs. Senior, em casa de Mr. Hall, viram Home, com o rosto transfigurado e brilhante, erguer-se duas vezes até o teto e deixar uma cruz, feita com lápis, na segunda levitação, de modo a assegurar às testemunhas que não eram vítimas de sua própria imaginação.
Em 1868 Lord Adare, Lord Lindsay, o Capitão Wynne e Mr. Smith Barry viram Home levitado várias vezes. Uma descrição minuciosa foi deixada pela primeira daquelas testemunhas da ocorrência de 16 de dezembro daquele ano, quando em Ashley House, em estado de transe, Home flutuou do quarto para a sala de estar, passando pela janela, a setenta pés acima da rua. Depois de chegar à sala, voltou para o quarto com Lord Adare e, depois que este observou que não compreendia como Home poderia ter passado pela janela, apenas parcialmente levantada, “ele me disse que se afastasse um pouco. Então passou pelo espaço aberto, primeiro a cabeça, muito rapidamente, estando o seu corpo aparentemente rígido e quase na horizontal. Voltou novamente, com os pés para frente”. Tal a informação dada por Lord Adare e Lord Lindsay. Diante de sua publicação, o Doutor Carpenter, que gozava de uma reputação nada invejável por uma perversa oposição a tudo quanto se relacionava com este assunto, escreveu exultante indicando que havia uma terceira testemunha que não tinha sido ouvida, admitindo sem o menor fundamento que o depoimento do Capitão Wynne seria em sentido contrário. Por fim disse que “um simples céptico honesto declara que Mr. Home esteve sentado todo o tempo em sua cadeira” afirmação que apenas pode ser tomada como falsa. Então o Capitão Wynne escreveu corroborando os outros depoimentos e acrescentando:
“Se o senhor não acredita na prova corroborante de três testemunhas insuspeitas, então será o fim de toda a justiça e das cortes da lei”.
Para ver quanto a crítica procurou uma saída para escapar ao inevitável, basta dizer que ela se agarrou ao que Lord Lindsay escreveu algum tempo depois, dizendo que a coisa tinha sido vista à luz da Lua. Entretanto o calendário mostra que naquele dia a Lua era invisível. Observa Mr. Andrew Lang:
“Entretanto, mesmo com cerração, a gente numa sala pode ver um homem entrar por uma janela e sair novamente, com a cabeça para frente, com o corpo rígido”.
A todos nós parece que se víssemos uma coisa tão maravilhosa, não nos preocuparíamos em determinar se a víamos à luz da Lua ou de lâmpadas da rua. Contudo deve-se admitir que a descrição de Lord Lindsay é redigida grosseiramente – tão grosseiramente que a gente quase desculpa Mr. Joseph Mc Cabe, quando diz numa conferência que os observadores não olhavam a coisa diretamente e a sua sombra no peitoril da janela, mas que se achavam de costas para a janela e apenas viam a sombra da coisa na parede. Entretanto, quando a gente considera a segurança das três testemunhas de vista que depuseram sobre o caso, tem o direito de perguntar se, quer no passado, quer no presente, qualquer fato extraordinário já foi mais claramente provado.
Tantos são os outros casos de levitação de Home que facilmente seria escrito um longo artigo sobre este particular aspecto de sua mediunidade. O Professor Crookes foi outras tantas vezes testemunha do fenômeno e se refere a cinqüenta exemplos que haviam chegado ao seu conhecimento. Haverá porém alguém de cérebro equilibrado que, tendo lido o incidente aqui referido, não diga, com o Professor Challis: “Ou os fatos devem ser admitidos tais quais são relatados, ou devemos dizer adeus à possibilidade de nos certificarmos de fatos através do testemunho humano”
“Voltamos, então, à era dos milagres?”, perguntará o leitor. Não há milagres. Nada neste plano é sobrenatural. Aquilo que vemos agora e o que lemos de tempos passados é apenas a operação da lei que ainda não foi bem estudada e definida. Já imaginamos algo de suas possibilidades e de suas limitações, que são tão exatas na sua maneira quanto as de qualquer força puramente física. Devemos fazer um balanço entre os que em nada acreditam e os que acreditam demais. Gradativamente a bruma se vai clarificando e poderemos definir os contornos da costa sombria. Quando pela primeira vez uma agulha foi movida pelo magneto, não houve infração às leis da gravidade. É que houve a intervenção local de outra força mais poderosa. Esse é também o caso quando as forças psíquicas atuam no plano da matéria. Se a fé que Home tinha em sua força tivesse faltado, ou se o seu círculo tivesse sido perturbado indevidamente, ele teria falhado. Quando Pedro perdeu a fé afundou-se nas ondas. Através dos séculos a mesma causa ainda produziu o mesmo efeito. A força espiritual ainda está conosco se não lhe voltamos a face e nada foi concedido à Judéia que fosse negado à Inglaterra.
A esse respeito é como uma confirmação do poder do invisível e como uma resposta final ao materialismo, tal qual o entendemos, que a carreira pública de Home é de suprema importância. Ele foi uma testemunha a afirmar a verdade daqueles chamados “milagres” que foram o pesadelo para tantas mentes espertas e agora se destinam a ser a prova sólida e forte da exatidão das narrativas primitivas. Milhões de almas em dúvida, na agonia dos conflitos espirituais reclamavam provas definitivas de que nem tudo era um vazio em redor de nós, de que havia forças fora do nosso alcance, de que o ego não era uma mera secreção do tecido nervoso e de que os mortos realmente levavam sua indestrutível existência pessoal.
Tudo isso foi provado pelo maior desses grandes missionários modernos, a qualquer um capaz de observar ou de raciocinar. É possível achar graça em mesas dançantes e em muros que tremem, mas estes foram os mais próximos e os mais naturais objetos que podiam, em termos materiais, registrar aquela força que estava acima do alcance humano. Um cérebro que fosse imobilizado por uma sentença inspirada seria levado à humildade e a novos caminhos de pesquisa em presença até do mais caseiro desses inexplicáveis fenômenos. É fácil chamá-los de pueris, mas realizaram o objetivo para que foram destinados, sacudindo em seus fundamentos a complacência daqueles materialistas homens de ciência que eram postos em contacto com eles. Eles não devem ser achados como um fim em si, mas como um meio elementar pelo qual a mente deveria ser conduzida a novos canais do pensamento. E esses canais do pensamento levaram ao reconhecimento da sobrevivência do Espírito.
“Trouxestes incalculável alegria e consolo ao coração de muita gente”, disse o Bispo Clark, de Rhode Island. “Iluminastes lugares habitados que antes eram trevas”. “Mademoiselle”, disse Home à moça que ia ser sua esposa, “há uma missão a mim confiada. Ela é grande e santa”.
O famoso Doutor Elliotson, imortalizado por Thackeray sob o nome de Doutor Goodenough, era um dos chefes do materialismo britânico. Encontrou Home, viu os seus poderes e teve a coragem de dizer imediatamente que tinha vivido toda a sua vida em trevas e pensava que nada havia na vida que não fosse material; mas que agora tinha a firme esperança que, assim pensava, haveria de alimentar enquanto vivesse.
Poderiam citar-se inúmeros exemplos do valor espiritual do trabalho de Home; mas ele jamais foi melhor sintetizado do que num período escrito por Mrs. Webster, de Florença, que viu muito da sua atuação. “Ele é o mais maravilhoso missionário dos tempos modernos e da maior de todas as causas, e o bem que ele tem feito não pode ser avaliado. Quando Mr. Home passa, derrama em seu redor a maior de todas as bênçãos – a certeza da vida futura”.
Agora que é possível conhecer detalhes de sua vida, pode-se dizer que é para o mundo inteiro que se dirige a mais vital de todas as mensagens. Sua atitude, em relação à sua própria missão, foi expressa numa conferência feita em Londres, na Sala Willis, a 15 de fevereiro de 1866. Disse ele: “Sinceramente penso que essa força aumentará cada vez mais para nos aproximar de Deus. Perguntareis se ela nos torna mais puros. Minha única resposta é que somos mortais apenas e, como tal, sujeitos ao erro. Mas ela ensina que aqueles de coração puro verão a Deus. Ela nos ensina que Deus é amor e que não há morte. Aos velhos ela vem como uma consolação, quando se aproximam as tempestades da vida e quando vem o descanso. Aos moços ela fala do dever que temos uns para com os outros e diz que colheremos o que houvermos semeado. A todos ensina resignação. Vem desfazer as nuvens do erro e trazer a manhã radiosa de um dia interminável”.
É curioso notar como a sua mensagem afetou os de sua geração. Lendo o relato de sua vida, escrita por sua esposa – um documento muito convincente, de vez que foi ela, de todas as criaturas, a que mais deveria ter conhecido o homem real – ressalta que o mais cordial apoio e o maior apreço lhe veio dos aristocratas da França e da Rússia, com os quais tinha tomado contacto. O caloroso brilho de admiração pessoal e até a reverência em suas cartas é tal, que dificilmente pode ser igualada em qualquer outra biografia. Na Inglaterra tinha ele um círculo íntimo de ardentes defensores, alguns das altas camadas sociais, como os Halts, os Howitts, Robert Chambers, Mrs. Milner Gibson, o Professor Crookes e outros. Mas havia uma lamentável falta de coragem entre estes, que admitiam os fatos na intimidade e se mantinham alheios em público. Lord Brougham e Bulwer Lytton eram do tipo de Nicodemos, principalmente o novelista. De um modo geral a “inteligência” saiu-se muito mal neste assunto e muitos nomes festejados sofreram com a história. Tyndall e Faraday foram fantasticamente anticientíficos nos seus métodos de prejulgar a questão, logo de saída, e posteriormente se ofereceram para a examinar, sob a condição de que fosse aceita a sua opinião. Sir David Brewster, como ficou dito, disse algo de honesto, e depois, em pânico, negou que o houvesse dito, esquecendo-se de que a prova já estava feita. Browning escreveu um longo poema – se é que aquilo se pode chamar poesia – descrevendo uma manifestação que jamais ocorreu. Carpenter conquistou uma notoriedade pouco invejável como opositor sem escrúpulos, ao proclamar uma singularíssima tese espírita de sua invenção. Os secretários da Sociedade Real recusaram o convite para assistirem às demonstrações de Crookes sobre os fenômenos físicos, enquanto se manifestavam terminantemente contra os mesmos. Lord Giffard despejou da Tribuna contra um súdito os primeiros elementos daquilo que ignorava.
Quanto ao clero nenhuma ordem deve ter sido dada, durante os trinta anos em que a mais maravilhosa dispensação espiritual desde muitos séculos foi dada ao público. Não é possível recordar o nome de um único clérigo britânico que tivesse mostrado um interesse inteligente.
E em 1872, quando começou a aparecer em The Times uma descrição minuciosa das sessões de São Petersburgo, a coisa foi cortada logo, segundo Mr. H. T. Humphreys, “devido às fortes queixas feitas a Mr. Delane, seu diretor, por algumas figuras da alta direção da Igreja da Inglaterra.” Tal foi a contribuição dos nossos dirigentes espirituais. O Doutor Elliotson, o nacionalista, era muito mais vivo do que eles. Eis o amargo comentário da senhora Home: “O veredicto de sua própria geração foi o do cego e do surdo contra quem vê e ouve.”
A caridade era uma das mais belas características de Home. Como toda verdadeira caridade, era secreta e só se tornava conhecida indiretamente, e por acaso. Um de seus numerosos caluniadores declarou que lhe havia endossado uma letra de cinqüenta libras em favor de seu amigo Mr. Rymer. Em legítima defesa apurou-se que não era uma letra, mas um cheque, enviado muito generosamente por Mr. Home para tirar aquele amigo de um apuro.
Considerando a sua constante pobreza, cinqüenta libras talvez representassem uma boa parte de suas reservas bancárias. Sua viúva se detém com perdoável orgulho sobre muitas provas encontradas em suas cartas, após a sua morte. “Agora é um artista desconhecido, para cujo pincel o generoso esforço de Home havia encontrado emprego; depois, é um trabalhador infeliz que escreve sobre a sua esposa doente, cuja vida foi salva pelo conforto proporcionado por Mr. Home; ou uma mãe que agradece o seu apoio para a iniciação de seu filho na vida. Quanto tempo e quanta atenção devotou ele aos outros quando as circunstâncias de sua vida levariam muitos homens a pensar apenas em si próprios e em suas necessidades.”
“Mande-me uma palavra do coração que tantas vezes soube consolar um amigo!” exclamava um de seus protegidos.
“Poderei um dia mostrar-me digno de todo o bem que você me fez?” pergunta outro numa carta.
Encontramo-lo vagando pelos campos de batalha, perto de Paris, às vezes debaixo de fogo, com os bolsos cheios de cigarros para os feridos. Um oficial alemão escreve afetuosamente para lhe lembrar como o salvou de morrer de hemorragia, carregando-o em seus fracos ombros para fora da zona de fogo. Certamente Mrs. Browning era um melhor juiz do caráter do que seu esposo e Sir Galahad um nome melhor do que Lama.
Ao mesmo tempo seria absurdo pintar Home como um caráter sem jaça. Tinha ele a fraqueza de seu temperamento e algo de feminino em sua disposição que se mostrava de muitas maneiras. Estando na Austrália, o autor teve oportunidade de ler uma correspondência datada de 1856, entre Home e o filho mais velho dos Rymer. Tinham viajado juntos pela Itália e Home tinha abandonado o amigo em circunstâncias que demonstravam inconstância e ingratidão. Mas é justo dizer que sua saúde era então tão precária que dificilmente poderíamos considerá-lo normal. “Tinha ele os defeitos de um caráter emotivo”, disse Lord Dunraven, “como a vaidade altamente desenvolvida, talvez sabiamente lhe permitindo subtrair-se ao ridículo que então era despejado sobre o Espiritismo e tudo quanto a este se ligava. Era sujeito a grandes depressões e crises nervosas dificilmente compreensíveis, mas era, também, simples, bondoso, de bom humor, de disposição amorável, que me atraía... Minha amizade ficou inalterável e sem diminuição até o fim.”
Há poucos daqueles variados dons, que chamamos “mediúnicos” e que São Paulo chama “do Espírito”, que Home não possuísse. Na verdade, a característica de sua força psíquica era uma invulgar versatilidade. Geralmente falamos de um médium de Voz Direta, de um que fala em transe, de um clarividente ou de um de efeitos físicos, quando Home era os quatro.
Tanto quanto podemos verificar, tinha ele pouca experiência quanto à força de outros médiuns e não estava isento daquele ciúme psíquico, que é um traço comum desses sensitivos. Mrs. Jencken, antes Miss Kate Fox, foi o único médium a quem teve amizade.
Sentia amargamente qualquer mistificação, e denotou sempre esse excelente fraco do caráter, qual o de guardar suspeitas de todas as formas de manifestações que não correspondessem exatamente às suas. Essa opinião, expressa de modo não comprometedor em seu último livro “Lights and Shadows of Spiritualism” naturalmente magoaram outros médiuns, que pretendiam ser tão honestos quanto ele. Um mais largo e profundo contacto com os fenômenos o teriam tornado mais caridoso. Assim, ele protestou fortemente contra toda sessão feita no escuro, o que é um conselho de perfeição, de vez que as experiências sobre o ectoplasma, que é a base física de todas as materializações, mostram, em geral, que aquele é afetado pela luz, exceto pela vermelha. Home não tinha grande experiência das materializações completas, tais como foram obtidas naqueles dias por Miss Florence Cook ou por Madame d’Esperance, ou em nossos dias pela mediunidade de Madame Bisson. Assim, podia ele dispensar a obscuridade completa em seu trabalho. Por isso sua opinião foi injusta para com os outros. Por outro lado, Home declarou enfaticamente que a matéria não podia passar através da matéria, porque os seus fenômenos não tomavam esse aspecto. Ainda a prova de que, em certos casos, a matéria podia passar através da matéria era esmagadora. Até pássaros de variedades raras foram trazidos para as salas de sessões, em circunstâncias que excluem qualquer fraude e as experiências de madeira que atravessa a madeira, como as que foram apresentadas a Zöllner e outros professores em Leipzig, foram tão concludentes que se acham relatadas pelo famoso físico na Física Transcendental, de suas experiências com Slade. Deste modo, deve-se levar como uma pequena fraqueza do caráter de Home o fato de gritar e duvidar das forças que porventura ele não possuísse.
Podem alguns acusá-lo de dirigir sua mensagem antes aos dirigentes da sociedade do que às massas trabalhadoras. É provável que, de fato, Home tivesse a fraqueza, assim como as graças de sua natureza artística, que o faziam sentir-se mais feliz numa atmosfera de elegância e de finura e uma repulsa visceral por tudo quanto fosse sórdido e desfavorecido.
Se outras razões não existissem, o precário estado de saúde o tornava inapto para qualquer tarefa pesada; as contínuas hemorragias o levaram a preferir a agradável e refinada vida na Itália, na Suíça e na Riviera. Mas, em relação ao desenvolvimento de sua missão, de lado o auto-sacrifício pessoal, não há a menor dúvida de que a sua mensagem, levada ao laboratório de um Crookes ou à Corte de um Napoleão, foi mais útil do que se tivesse sido levada à multidão. A aprovação da ciência e do caráter era necessária antes que o público ficasse seguro de que essas coisas eram verdadeiras. Se isso não foi inteiramente conseguido a falta cabe certamente aos encapuçados homens de ciência e aos pensadores da época e de modo algum Home, que representou o seu papel de demonstrador com perfeição, deixando a outros homens menos dotados a análise e a publicidade do que lhes havia mostrado. Não era ele um homem de ciência, mas a matéria-prima da ciência, desejando ansioso que os outros dele pudessem aprender tudo quanto pudesse trazer ao mundo, de modo que a própria ciência pudesse dar testemunho da religião, enquanto se apoiasse sobre a ciência. Quando a mensagem de Home tiver sido aprendida completamente, um homem sem fé não será acusado de impiedade, mas de ignorância.
Havia algo de patético no esforço de Home para descobrir alguma crença na qual pudesse satisfazer o seu próprio instinto gregário – porque ele não era tido como um individualista cabeçudo – e ao mesmo tempo achar um nicho no qual pudesse depositar seu próprio volume de autênticas verdades. Sua peregrinação reivindica a afirmação de alguns espíritas de que um homem pode pertencer a qualquer crença e possuir conhecimentos espíritas, mas também apóia os que replicam que a perfeita harmonia com aqueles conhecimentos espíritas só pode ser encontrada, tal qual a coisa se encontra agora, numa comunidade espírita especial. Ah! se pudesse ser assim, pois é ele demasiado grande para afogar-se numa seita, por maior que seja ela. Na mocidade Home seguiu a Wesley, mas logo se passou para a mais liberal atmosfera do Congregacionalismo. Na Itália a atmosfera artística da Igreja Católica Romana e, possivelmente o registro de tantos fenômenos semelhantes aos seus próprios, levaram-no a se converter com a intenção de entrar para uma ordem monástica – intenção que o seu bom senso o levou a abandonar. A sua mudança de religião se deu num período em que as forças psíquicas o haviam abandonado durante um ano e seu confessor lhe garantiu que elas eram de origem perversa e que jamais lhe voltariam, agora que se transformara num filho da verdadeira Igreja. Não obstante, no próprio dia em que se completava um ano, elas voltaram com renovado vigor. Desde então parece que Home foi católico apenas de nome, se é que o foi, e depois de seu segundo casamento – ambos com senhoras russas – foi ele fortemente atraído para a Igreja Grega e foi no seu ritual que o seu corpo foi encomendado em St. Germain, em 1886. “A outro o discernimento dos Espíritos” (1 Epístola aos Coríntios, capítulo 12º versículo 10) é a curta inscrição sobre aquele túmulo, do qual o mundo ainda não ouviu a última palavra.
Se fossem necessárias provas da vida inatacável de Home, estas não poderiam ser melhor apresentadas do que pelo fato de que seus numerosos inimigos, sempre à espera de uma oportunidade para o ataque, jamais puderam encontrar algo em toda a sua carreira para um comentário, a não ser o caso absolutamente inocente, e que se tornou conhecido como o caso Home-Lyon. Qualquer juiz imparcial, lendo os depoimentos nesse caso, – e estes se encontram verbum ad verbum na segunda série dos “Incidents in My Life” – conviria que não há censura mas comiseração devida a Home. Não se poderia desejar maior nobreza de caráter do que a sua em relação àquela mulher desagradável e caprichosa, que inicialmente lhe havia doado boa soma de dinheiro e depois, mudando de idéia, ao ver frustrada a esperança de ser apresentada na alta sociedade, nada levou em consideração com intuito de reaver aquele dinheiro. Se ela apenas tivesse pedido a sua devolução, não há dúvida de que os delicados sentimentos de Home o teriam levado a devolvê-lo, ainda que lhe tivesse custado muito trabalho e despesas, pois se tratava de mudar o seu nome para Home-Lyon, a fim de satisfazer a vontade daquela mulher que queria adotá-lo como filho. Suas exigências, entretanto, eram tais, que ele não as poderia aceitar honrosamente, pois implicava o reconhecimento de que procedera mal aceitando o presente. Consultando as cartas originais – o que, parece, não foi feito pelos poucos que comentaram o caso – verifica-se que Home, o seu procurador S. C. Hall e seu advogado Mr. Wilkinson imploraram àquela senhora que moderasse a sua desarrazoada benevolência que se havia transformado tão rapidamente numa malevolência ainda mais desarrazoada. Ela estava absolutamente determinada a que Home ficasse com o dinheiro e se constituísse seu herdeiro. Jamais houve um homem menos mercenário: ele lhe pediu repetidamente que pensasse em seus parentes, ao que ela respondia que o dinheiro lhe pertencia e que ela poderia fazer com ele o que bem quisesse e que nenhum parente dependia dela. Desde o momento em que aceitou a situação, agiu e escreveu como um filho devotado e não é falta de caridade supor que essa atitude inteiramente filial não tivesse sido aquela que a velhota havia planejado. De qualquer modo, cedo ela se cansou de esperar e exigiu o dinheiro sob a escusa – escusa monstruosa para quem quer que leia as cartas e considere as datas – de que mensagens espíritas é que a tinham levado a tomar aquela resolução.
O caso correu na Corte de Chancery e o juiz aludiu a “inúmeras falsidades de Mrs. Lyon, em tão importantes detalhes –falsidades declaradas sob juramento e tão perversas que causavam um grande embaraço à Corte e desacreditavam o testemunho da queixosa”. A despeito desse comentário cáustico e da elementar justiça, o veredicto foi contra Home, por isso que, de um modo geral, é taxada como falha de provas a defesa em tais casos e uma completa falta de provas é impossível quando a ação é contestada. Sem dúvida Lord Giffard se teria mostrado superior à simples letra da lei, se não fosse tão profundamente contrário a qualquer referência às forças psíquicas, que, no seu modo de ver, eram manifestamente absurdas e ainda eram sustentadas pela defesa em sua cara, na sua própria Corte de Chancery. Até os piores inimigos de Home foram forçados a admitir que o fato de haver ele retido o dinheiro na Inglaterra, em vez de o depositar em lugar onde não pudesse ser requisitado, prova as suas intenções honestas no mais infortunado episódio de sua vida. Não há notícia de que tenha ele perdido a amizade de um só dos homens de honra, que o tinham como amigos, por causa das maquinações de Mrs. Lyon. Os próprios motivos dessa senhora eram óbvios. Como todos os documentos estavam em ordem, seu único caminho para recuperar o dinheiro foi acusar Home de extorsão por meio de simulação; e ela era bastante esperta para saber que chance teria um médium – mesmo um médium amador e que não se fazia pagar – na ignorante e material atmosfera de uma corte de justiça do período médio-vitoriano. Ah! omitamos esse médio-vitoriano e a verificação é a mesma.
As faculdades de Home foram atestadas por tantos e tão famosos observadores e foram mostradas sob condições tão francas que nenhum homem razoável poderá pô-las em dúvida.
Só a prova de Crookes é conclusiva.
Há também, o notável livro, recentemente reeditado, no qual Lord Dunraven conta a história de sua mocidade em ligação com Home.
Mas, de lado estes, entre aqueles que na Inglaterra investigaram nos primeiros anos e cujo testemunho público ou cartas a Home mostram que não só estavam convencidos dos fenômenos, mas também de sua origem espiritual, devemos mencionar a Duquesa de Sutherland, Lady Shelley, Lady Gomm, o Doutor Robert Chambers, Lady Otway, Miss Catherine Sinclair, Mrs. Milner Gibson, Mr. e Mrs. William Howitt, Mrs. De Burgh, o Doutor Gully (of Malvern), Sir Charles Micholson, Lady Dunsany, Sir Daniel Cooper, Mrs. Adelaide Senior, Mr. e Mrs. 5. C. Hall, Mrs. MacDougall Gregory, Mr. Pickersgill, R. A., Mr. E. L. Blanchard e Mr. Robert Bell.
Outros que chegaram a admitir que a teoria da impostura era insuficiente para explicar os fenômenos foram: Mr. Ruskin, Mr. Thackeray (então redator do Cornhill Magazine), Mr. John Bright, Lord Dufferin, Sir Edwin Arnold, Mr. Heaphy, Mr. Durham (escultor), Mr. Nassau Senior, Lord Lyndhurst, Mr. J. Hutchinson (ex-secretário da Bolsa) e o Doutor Lockhart Robertson.
Tais foram as testemunhas e tal o seu trabalho. E ainda quando a sua vida utilíssima e altruísta chegava a seu fim, deve ser lembrado, para eterna vergonha da Imprensa Britânica, que dificilmente se encontra um jornal que não se referisse a ele como um impostor e um charlatão. Contudo chega o momento em que ele será reconhecido pelo que realmente foi – um dos pioneiros do lento e árduo avanço da Humanidade na selva da ignorância, que tanto a retardou.
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