sábado, 20 de junho de 2009

Cap. 12 Os irmãos Eddy e os Holmes

Dentro de certos limites é difícil acompanhar o aparecimento de vários médiuns nos Estados Unidos. O estudo de um ou dois casos proeminentes é suficiente para servir de exemplo do todo. Os anos de 1874 e 1875 foram marcados por grande atividade psíquica e produziram convicção por um lado e escândalo pelo outro. No conjunto parece que predominou o escândalo; mas se com ou sem razão, é uma questão que também pode ser discutida. Os adversários da verdade psíquica contam com o clero de várias igrejas, com a ciência oficial e com a enorme massa inerte da humanidade material; tinham a imprensa profana às suas ordens; de modo que tudo quanto lhe fosse favorável ou era sonegado ou distorcido e tudo quanto lhe fosse contrário tinha a mais larga publicidade. Daí ser necessária uma constante verificação de passados episódios e uma reconsideração de valores. Mesmo agora a atmosfera é saturada de preconceitos. Se um homem de responsabilidade entrasse agora na redação de um jornal londrino e dissesse que tinha pilhado um médium em fraude, a coisa seria aceita com satisfação e espalhada por todo o país. Se o mesmo homem proclamasse que, debaixo do mais rigoroso controle os fenômenos eram autênticos, é pouco provável que lhe consagrassem um período. A edição já estaria sobrecarregada... Na América, onde praticamente não existe uma lei contra a difamação, e onde a Imprensa é por vezes violenta e sensacional, esse estado de coisas era e, possivelmente, ainda é – talvez mais evidente.
O primeiro incidente notável foi a mediunidade dos irmãos Eddy, que talvez jamais tenha sido superada no terreno da materialização ou, como podemos agora chamar, das formas ectoplásmicas. A dificuldade então em aceitar esses fenômenos repousava no fato de que os mesmos pareciam regidos por leis desconhecidas e se acharem isolados de toda a nossa experiência da Natureza. Os trabalhos de Geley, de Crawford, de Madame Bisson, de Schrenck Notzing e de outros removeram essa dificuldade e nos deram, quando mais não seja, uma hipótese perfeitamente científica, apoiada em prolongadas e cuidadosas investigações, de modo que podem pôr alguma ordem no assunto. Isto não existia em 1874 e podemos admitir a dúvida, mesmo nos espíritos mais honestos e cândidos, quando lhes pediam que acreditassem que dois rudes camponeses, desajeitados e sem instrução, podiam produzir requintados fenômenos que eram negados ao resto do mundo e completamente inexplicáveis pela ciência:
Os irmãos Eddy, Horatio e William, eram primitivos moradores de uma pequena propriedade na aldeia de Chittenden, perto de Rutland, no Estado de Vermont. Um observador os descreveu como “sensitivos, frios e abruptos com os estranhos, mais parecendo trabalhadores braçais de fazenda do que profetas ou sacerdotes de uma nova dispensação; de compleição maciça, cabelos e olhos negros, articulações duras, atitude desgraciosa, encolhida e que embaraça os recém-chegados. Não se dão com alguns vizinhos e para outros não são simpáticos... Na verdade se acham separados da opinião pública, que não está preparada ou desejosa de estudar os fenômenos, as maravilhas científicas, ou as revelações do outro mundo”.
Os rumores dos estranhos acontecimentos que se passaram em casa dos irmãos Eddy se espalharam e despertaram uma curiosidade semelhante à causada pela sala de música de Koons nos primeiros dias. Veio gente de toda parte investigar. Parece que os Eddy tinham acomodações amplas, embora primitivas, para os seus visitantes, e que os alojavam num grande quarto, onde o reboco das paredes caía aos pedaços e a comida era tão simples como a das cercanias. Cobravam essa hospedagem modicamente e parece que não tiravam nenhuma vantagem disso a não ser a demonstração de suas faculdades psíquicas.
Uma grande curiosidade tinha sido despertada em Boston e em New York pelo relato do que acontecia e um jornal de New York, o Daily Graphic, encarregou o Coronel Olcott de fazer investigações. Olcott não se havia identificado até então com qualquer movimento psíquico – ao contrário, tinha o espírito prevenido contra isso e iniciou a sua tarefa antes com o fito de desmascarar um impostor. Era um homem de mente clara, de notável habilidade e com um alto sentido de honra. Ninguém poderá ler os ricos e íntimos detalhes de sua vida, contados em suas memórias, “Old Diary Leaves”, sem sentir respeito por aquele homem tão leal, desinteressado, e com uma rara coragem moral de seguir a verdade e aceitar os resultados, mesmo quando opostos à nossa expectativa e aos nossos desejos. Não era um sonhador místico, mas um homem de negócios muito prático e algumas de suas observações psíquicas despertaram menos atenção do que mereciam.
Olcott ficou dez semanas na atmosfera de Vermont, o que demonstrou uma considerável força de vontade em suportar o meio primitivo e a vida dura daquela gente. Voltou com algo próximo do aborrecimento pessoal pela morosidade de entendimento com os seus hóspedes, mas, por outro lado, com absoluta confiança em seus poderes psíquicos. Como todo investigador sensato, recusa-se a dar atestados em branco sobre o caráter e não responde pelas ocasiões em que não se achava presente, nem pela futura conduta daqueles a quem julga. Limita-se à sua experiência do momento e, em quinze notáveis artigos publicados no New York Daily Graphic, em outubro e novembro de 1874, deu os resultados completos e as medidas que havia tomado para os controlar. Lendo-os, é difícil lembrar uma precaução que não tenha sido tomada.
Seu primeiro cuidado foi examinar a história dos Eddy. Foi um bom registro, a que não faltaram manchas. Nunca será demais insistir em que o médium é um mero instrumento e que o seu dom nenhuma relação tem com o seu caráter. Isto se aplica aos fenômenos físicos, mas não aos mentais, porque jamais um alto ensino poderia chegar através de um canal inferior.
Nada havia de mau na investigação daqueles irmãos, mas admite-se que certa vez deram uma falsa exibição de mediunidade, anunciando-a como tal, mas praticando truques. É provável que tal tivesse sido feito para dar o que falar e ainda para conciliar os vizinhos fanáticos, que viviam enfurecidos contra os legítimos fenômenos. Seja qual for a causa ou motivo, Olcott foi naturalmente levado a tornar-se muito circunspecto em seus contactos, desde que mostrava um bom conhecimento dos truques.
A ancestralidade era muito importante, porque, não só havia uma ininterrupta cadeia de poderes psíquicos, que se estendia sobre várias gerações, como, também, a avó deles, que fora processada quatro vezes como feiticeira, fora queimada como tal ou, pelo menos, sentenciada, no famoso processo de Salém, em 1692. Muitos de nossos contemporâneos gostosamente fariam o mesmo com os nossos médiuns, como foi o caso de Cotton Mather.
Mas as perseguições policiais constituem o seu equivalente moderno, O pai dos Eddy foi, infelizmente, um desses fanáticos perseguidores. Olcott declara que os meninos foram marcados para toda a vida pelos golpes que o pai lhes havia dado, visando desencorajar aquilo que chamava de poderes diabólicos. A mãe, que era possuidora de grande força psíquica, ficou sabendo como esse bruto “religioso” agia injustamente: seu lar tornou-se um inferno na terra. Não havia refúgio para as crianças em parte alguma, pois os fenômenos psíquicos geralmente as acompanhavam, até mesmo à escola e excitava a grita dos jovens bárbaros ignorantes em seu redor. Em casa, quando o jovem Eddy caía em transe o pai e um vizinho despejavam água fervente sobre ele e punham brasas vermelhas sobre a cabeça, deixando-lhe marcas indeléveis. Felizmente o rapaz estava adormecido. É de admirar que depois de uma tal infância as crianças se tivessem tornado homens sombrios e desconfiados?
Depois que cresceram, o infeliz pai tentou fazer dinheiro por meio dos poderes que tão brutalmente havia desencorajado e alugava os rapazes como médiuns. Ninguém jamais descreveu adequadamente os sofrimentos a que se sujeitam os médiuns públicos nas mãos de investigadores idiotas e cépticos cruéis. Olcott testemunhou que as mãos e os braços das irmãs, bem como dos irmãos, estavam cheios de marcas das ligaduras e de escaras produzidas por lacre quente para selar os nós, enquanto que duas das meninas tinham pedaços de pele e carne esgarçadas pelas algemas. Eram enjauladas, batidas, queimadas, apedrejadas, enquanto as cabines eram destroçadas. O sangue escorria dos cantos das unhas, devido à compressão das artérias. Assim foram os primeiros dias na América, mas a Grã-Bretanha não ficou atrás, se recordarmos os irmãos Davenport e a violência brutal da massa em Liverpool.
Parece que os Eddy eram possuidores de todas as mediunidades. Olcott dá esta lista: batidas, movimento de objetos, pintura a óleo e aquarela sob influência de Espíritos, profecia, fala de línguas estranhas, poder de cura, discernimento dos Espíritos, levitação, escrita de mensagens, psicometria, clarividência, e, finalmente, a produção de formas materializadas.
Desde que São Paulo enumerou os dons do Espírito, jamais se organizou uma lista mais extensa.
O método das sessões era o seguinte: o médium ficava sentado numa cabine de um lado da sala, e a assistência em bancos, enfileirados à sua frente. Perguntar-se-á por que uma cabine. E a experiência continuada mostrou que, de fato, esta pode ser dispensada, salvo no fenômeno de materialização. Home jamais usou a cabine e atualmente os principais médiuns ingleses raramente a empregam. Há, contudo, uma razão muito aceitável para a sua presença.
Sem querer ser muito didata num assunto que ainda se acha na fase de exame, pode ser admitido, como hipótese muito aceitável, que os vapores ectoplásmicos, que se solidificam numa substância plástica, da qual surgem as formas, podem condensar-se mais facilmente num espaço limitado. Entretanto, achou-se que a presença do médium não era necessária dentro desse espaço. Na maior sessão de materialização a que o autor esteve presente, na qual cerca de vinte formas de várias idades e tamanhos apareceram numa noite, o médium estava sentado fora da porta da cabine, da qual saíam as formas. É de presumir que, de acordo com a hipótese, seu vapor ectoplásmico fosse levado para aquele espaço confinado, independentemente da posição de seu corpo físico. Isso não tinha sido reconhecido ao tempo da investigação, de modo que a cabine foi utilizada.
É óbvio, entretanto, que a cabine oferecia um meio para fraudes e disfarces, com o que era cuidadosamente examinada. Ficava num segundo andar, e tinha uma janelinha. Olcott tinha a janela tapada com tela antimosquito, pregada por fora, O resto da cabine era de madeira sólida e só atingível pela sala onde se achavam os espectadores. Parece que não havia possibilidades de fraudes. Olcott a tinha feito examinar por um perito, cujo certificado aparece no livro.
Em tais circunstâncias Olcott contou em seus artigos e, depois, no seu notável livro “People from the Other World” que, certamente, durante dez semanas, viu nada menos de quatrocentas aparições saindo da cabine, de todas as formas, tamanhos, sexos e raças, vestidos maravilhosamente, crianças de colo, guerreiros índios, cavalheiros em trajes de rigor, um curdo com uma lança de nove pés, uma índia pele vermelha fumando, senhoras com vestidos elegantes, etc. Tal o testemunho de Olcott.
E não havia um caso que ele não fosse capaz de dar as mais seguras provas. Seu relato foi recebido com incredulidade, mas agora já produz menor descrença. Mas Olcott dominava o assunto e, tomando suas precauções, preveniu, assim como prevenimos, a crítica daqueles que, não tendo estado presentes, preferem dizer que os que estavam ou foram enganados ou eram malucos. Diz ele: “Se alguém lhes fala de crianças carregadas por senhoras que saem da cabine, ou de moças de formas flexíveis, cabelos dourados e pequena estatura, de velhas e velhos apresentando-se em corpo inteiro e falando conosco, de criançolas, vistas aos pares, simultaneamente com outras formas e roupas diferentes, de cabeças calvas, de cabelos grisalhos, de feias cabeças negras de cabelos encarapinhados, de fantasmas imediatamente reconhecidos como amigos, e fantasmas que falam de modo audível línguas estranhas que o médium desconhece – sua indiferença não se altera... A credulidade de alguns homens de ciência, também, seria ilimitada – antes prefeririam acreditar que uma criança possa levantar uma montanha sem uma alavanca do que um Espírito possa levantar um peso.”
Mas, de lado o céptico irredutível, que ninguém convence, e que, no último dia classificará o Anjo Gabriel como uma ilusão de ótica, há algumas objeções muito naturais que um novato pode fazer honestamente e um pensador honesto pode responder. Podemos aceitar uma lança de nove pés como sendo um objeto espiritual? Que dizer dessas roupagens?
De onde vêm elas? A resposta se encontra, até onde podemos entender as coisas, nas admiráveis propriedades do ectoplasma. É a mais protéica substância, capaz de ser moldada instantaneamente em qualquer forma, e o poder de moldagem é a vontade do Espírito, dentro ou fora de um corpo. Tudo pode ser instantaneamente feito com ele, desde que assim o decida a inteligência predominante. Em todas as sessões dessa natureza parece que se acha presente um ser espiritual controlador, que comanda as figuras e confecciona o programa. Às vezes fala e dirige abertamente. Outras vezes fica calado e se manifesta apenas por atos. Como ficou dito, muitas vezes os controles são índios Peles-Vermelhas, que parecem ter em sua vida espiritual uma afinidade especial com os fenômenos físicos.
William Eddy, o médium principal desses fenômenos, parece nada haver sofrido quanto à saúde e à força, naquilo que em geral é um processo de exaustão. Crookes constatou como ficava Home “como que desfalecido no chão, pálido e sem fala.” Entretanto Home não era um rude camponês, mas um inválido sensitivo e artista. Parece que Eddy comia pouco, mas fumava continuamente. Nas sessões eram empregados a música e o canto, porque de longa data foi observado que há uma íntima conexão entre as vibrações musicais e os resultados psíquicos. Também se verificou que a luz branca é prejudicial aos resultados, o que agora é explicado pelo efeito dissociativo que a luz exerce sobre o ectoplasma. Muitas cores têm sido examinadas com o fito de evitar a completa escuridão. Mas, se se pode confiar no médium a escuridão é mais favorável, especialmente aos fenômenos de fosforescência e de jatos de luz, que se contam entre os mais belos fenômenos. Se se empregar luz, a mais tolerada é a vermelha. Nas sessões de Eddy havia uma luz atenuada de uma lâmpada velada.
Seria cansativo para o leitor entrar em detalhes sobre os vários tipos que apareceram nessas interessantes reuniões. Madame Blavatsky, então uma criatura desconhecida em New York, tinha vindo observar as coisas. Naquela época ainda não havia ela desenvolvido a linha teosófica do seu pensamento e era uma espiritista ardorosa. O Coronel Olcott e ela se encontravam pela primeira vez na casa da fazenda de Vermont, onde começou uma amizade que produziria no futuro estranhos desenvolvimentos. Em sua homenagem, ao que parece, apareceu um séquito de imagens russas, mantendo com ela uma conversação nessa língua. A principal figura, entretanto, era um chefe índio, chamado Santum, e uma índia de nome Honto, que se materializaram tão completamente e tantas vezes que a assistência seria desculpada por esquecer que estava tratando com Espíritos. Tão grande foi o contacto, que Olcott mediu Honto numa escala pintada ao lado da porta da cabine. Tinha um metro e sessenta centímetros. Certa vez expôs o seio e pediu a uma senhora presente que observasse as batidas do coração. Honto era leviana, gostava de dançar, de cantar, de fumar e exibir sua rica cabeleira negra aos assistentes. Santum, por outro lado, era um guerreiro taciturno, de um metro e noventa centímetros. O médium tinha apenas um metro e setenta e cinco centímetros.
Digno de menção é o fato de o índio usar sempre um polvarinho de chifre, que lhe fora dado então por um dos assistentes. Estava pendurado na cabine e lhe fora dado quando estava materializado. Alguns dos Espíritos de Eddy falavam, outros não, e a fluência variava muito.
Isto concordava com a experiência do autor em sessões semelhantes. Parece que a alma que volta tem muito que aprender quando maneja esse simulacro de si própria e que aqui, como alhures, a prática vale muito. Ao falar, essas figuras movem os lábios exatamente como faziam em vida. Também foi mostrado que a sua respiração em água de cal produz a reação característica de dióxido de carbono. Diz Olcott: “Os próprios Espíritos dizem que têm de aprender a arte de se materializar, como a gente procederia com qualquer outra arte”.
A princípio apenas podem moldar mãos, como no caso dos Davenport, das Fox e outros. Muitos médiuns jamais vão além desse estágio.
Entre os numerosos visitantes da casa de Vermont naturalmente alguns havia que assumiam uma atitude hostil. Nenhum destes, entretanto, parece ter dominado inteiramente o assunto. Um dos que mais chamavam a atenção foi um tal Doutor Beard, médico de New York, que, apenas com uma sessão, sustentava que todas as figuras eram disfarces do próprio William Eddy. Para sustentar esse ponto de vista nenhuma prova foi produzida, mas apenas a sua opinião pessoal; e ele declarava ser capaz de produzir os mesmos resultados com aparelhos de teatro do custo de três dólares. Tal opinião bem podia ser formulada honestamente numa única sessão, especialmente se esta tivesse sido mais ou menos bem sucedida. Mas é perfeitamente insustentável quando comparada com as das pessoas que assistiram a várias sessões. Assim, o Doutor Hodgson, de Stoneham, em Massachussetts, com mais quatro outras testemunhas, assinam um documento que diz: “Atestamos que... Santum estava do lado de fora, na plataforma, quando um outro índio mais ou menos da mesma estatura saiu e os dois passavam e repassavam um pelo outro, andando para cima e para baixo. Ao mesmo tempo era mantida uma conversa entre George Dix, Mayflower, o velho Mr. Morse e Mrs. Eaton, dentro da cabine. Nós reconhecemos a voz familiar de cada um”.
Há muitas testemunhas de fatos semelhantes, além de Olcott; e todos põem a teoria dos disfarces está fora de cogitação. É preciso acrescentar que muitas das formas eram crianças e até crianças de colo. Olcott mediu uma criança cuja altura era de setenta e um centímetros.
Poder-se-ia acrescentar honestamente que uma coisa que preocupa ocasionalmente o leitor é a hesitação de Olcott, além de sua reserva. A coisa era nova para ele e de vez em quando uma onda de receio e de dúvida passava por sua mente e ele pensava que tivesse ido muito longe e que devia contorná-la, caso, de algum modo, mostrassem que ele estava errado.
Assim, diz ele: “As formas que vi em Chittenden, enquanto aparentemente desafiando qualquer outra explicação que não a de uma origem supra-sensível, permanecem, do ponto de vista científico como ainda ‘não provadas’.” Noutra passagem refere-se a falta de “condições para testes”.
Esta expressão tornou-se uma espécie de advertência que perde toda significação. Assim, quando se diz ter visto, fora de qualquer dúvida ou engano, o rosto da própria mãe falecida, o oponente replica: “Ah! mas foi sob condições para teste?” O teste repousa no próprio fenômeno. Quando se pensa que durante dez semanas Olcott pôde examinar a pequena cabine, vigiar o médium, medir e pesar as formas ectoplásmicas, fica-se a pensar o que é que se poderia exigir para fazer prova completa. O fato é que enquanto Olcott escrevia o seu relato veio o suposto desmascaramento de Mrs. Holmes e a parcial retratação de Mr. Dale Owen, o que o levou a tomar essas precauções.
Foi a mediunidade de William Eddy que tomou a forma de materializações. Horace Eddy fez sessões de caráter bem diverso. Em seu caso foi usada uma espécie de tela, em cuja frente ele se sentava com um dos assistentes, ao seu lado, sob boa luz e segurando a sua mão. Do outro lado da tela era colocado um violão ou outro instrumento, que então começava a ser tocado, aparentemente sem executante, enquanto mãos materializadas eram vistas às bordas da cortina. O efeito geral era muito semelhante ao produzido pelos irmãos Davenport, mas era mais impressionante, uma vez que o médium era visto inteiramente e se achava sob controle de um espectador. A hipótese da moderna ciência psíquica, baseada em muitas experiências, é que faixas invisíveis de ectoplasma, que são antes condutoras de força do que forças elas próprias, são emitidas do corpo do médium e aplicadas sobre o objeto que deve ser manipulado, sendo empregadas para o levantar, para o tocar, conforme um poder invisível o deseje – poder invisível que, conforme pretende o Professor Charles Richet, é um prolongamento da personalidade do médium e, conforme a mais avançada escola, uma entidade independente. Nada disso era conhecido ao tempo dos Eddys e os fenômenos apresentavam uma indubitável aparência de toda uma série de efeitos sem causa. Quanto à realidade do fato, é impossível ler a minuciosa descrição de Olcott sem ficar convencido de que não poderia haver erro nisso. Esse movimento de objetos à distância do médium, ou telecinesia, para usar a expressão moderna, é um raro fenômeno à luz; mas certa ocasião, numa reunião de amadores, que eram espíritas experimentados, o autor viu uma espécie de bandeja de madeira, à luz de uma vela, ser levantada pela borda e responder a perguntas por meio de batidas, quando se achava a menos de dois metros de distância.
Nas sessões em escuridão de Horatio Eddy, onde a completa ausência de luz dava todo vigor à força psíquica, Olcott verificou que havia uma louca dança guerreira de índios, com o sapateado de uma dúzia de pés e, simultaneamente, o som de um instrumento selvagem, acompanhado por guinchos e gritos. “Como pura exibição de força bruta”, diz ele, “essa dança índia provavelmente é insuperável nos anais de tais manifestações”. Uma luz produzida instantaneamente encontraria os instrumentos cobertos no chão, e Horatio em profundo sono, sem uma gota de suor, inconsciente em sua cadeira. Assegura-nos Olcott que tanto ele quanto outros cavalheiros presentes, cujo nome declina, tiveram a permissão de se sentarem sobre o médium, mas que em um ou dois minutos todos os instrumentos estavam sendo tocados novamente. Depois dessa experiência – e as houve muitíssimas – qualquer verificação posterior parece desnecessária. A menos que houvesse uma absoluta falta de senso da parte de Olcott e de outros espectadores, não há dúvida que Horatio Eddy exercitava poderes de que a ciência tinha, e ainda tem, um conhecimento imperfeito.
Algumas das experiências de Olcott são tão definitivas e narradas tão franca e claramente que merecem respeitosa consideração e se adiantam aos trabalhos de muitos dos nossos modernos pesquisadores. Por exemplo, ele trouxe de New York uma balança, que foi devidamente aferida e dada como exata num certificado publicado para esse efeito. Então persuadiu a uma das formas materializadas, a índia Honto, a ficar de pé sobre ela, enquanto o seu peso era verificado por uma terceira pessoa, Mr. Pritchard, cavalheiro respeitável e não interessado no assunto. Olcott faz um relato dos resultados e adiciona um certificado de Pritchard, como jurado perante um juiz. Honto foi pesada quatro vezes, de pé sobre a plataforma, de modo que não podia de modo algum aliviar o seu peso. Era uma mulher de um metro e sessenta centímetros de altura e era de esperar que registrasse um peso de cerca de sessenta e um quilos. Os quatro resultados foram, respectivamente, de 39,9; 26,3; 26,3 e 29,5 quilos – todos tomados na mesma noite. Isso parece mostrar que seu corpo era um mero simulacro, cuja densidade podia variar de momento a momento. Também demonstrou aquilo que mais tarde foi verificado por Crawford, que todo o peso do simulacro não poderia derivar do médium. É inconcebível que Eddy, cujo peso era de cerca de 82 quilos, fosse capaz de dar quase 40. Toda a assistência, conforme a sua capacidade, que varia enormemente, é chamada a contribuir; e outros elementos podem muito provavelmente ser trazidos da atmosfera. Atualmente a maior perda de peso demonstrada por Miss Goligher, nas experiências de Crawford, foi de 23,7 quilos; mas cada um dos assistentes sofreu uma perda de peso, conforme registrou o mostrador das cadeiras-balanças: era a contribuição individual para a formação do ectoplasma.
Também preparou o Coronel Olcott duas balanças de mola e fez testes da capacidade de tração das mãos dos Espíritos, enquanto as do médium eram seguradas por alguém da assistência. Uma mão esquerda puxou com uma força de 18 quilos e a direita, de 23,6 quilos, a uma luz tão boa que Olcott pôde ver que na mão direita faltava um dedo. Ele estava familiarizado com o caso, pois se tratava do Espírito de um marinheiro que havia perdido um dedo em vida. Quando a gente lê tais coisas, o aviso de Olcott de que seus resultados não eram definitivos e de que não tinha ele as perfeitas condições de experimentação, nos torna mais difícil a compreensão. Entretanto, fecha as suas conclusões com estas palavras: “Não obstante o número de cépticos se batendo contra esses fatos graníticos; não obstante o disfarce que possam vestir os “desmascaradores”, a trombetear cornetinhas de brinquedo, essa Jericó resistirá”.
Uma observação feita por Olcott foi que essas formas ectoplásmicas obedeciam facilmente a um comando mental de um assistente de mente forte, pois iam e vinham aonde estes quisessem. Outros observadores em várias sessões notaram o mesmo fato, o que pode ser tomado como um dos pontos verificados nesse problema crucial.
Há um outro ponto curioso que possivelmente Olcott deixou de noticiar. Os médiuns e os Espíritos que tinham sido muito seus amigos durante a sua longa visita, subitamente se tornaram azedos e esquivos. Parece que essa mudança se operou logo depois da chegada de Madame Blavatsky, com quem Olcott havia estabelecido íntimas relações. Como se sabe, aquela senhora era uma espírita convicta na ocasião, mas é possível que os Espíritos tenham previsto e pressentido o perigo oferecido pela dama russa. Os seus ensinos teosóficos, apresentados um ou dois anos mais tarde, eram tais que, embora os fenômenos fossem reais, os Espíritos eram meros cascões astrais e não tinham vida própria. Seja qual for a verdadeira explicação, a mudança nos Espíritos foi notável. “Muito embora a importância de meu trabalho tenha sido reconhecida e todas as facilidades razoáveis me tenham sido concedidas, eu era constantemente mantido a distância, como se fosse um inimigo, em vez de um observador sem preconceitos”.
O Coronel Olcott narra muitos casos onde os assistentes reconheceram Espíritos, mas neles não se pode confiar muito, porque com uma luz fraca e as condições emocionais é fácil de ser enganado um observador honesto. O autor tem tido a oportunidade de demorar o olhar sobre rostos de cerca de cem dessas imagens e apenas se lembra de dois casos nos quais estava absolutamente certo de sua identidade. Em ambos esses casos os rostos tinham sua própria luz e o autor não dependia de lâmpada vermelha. Houve duas outras ocasiões em que, com a lâmpada vermelha, ele estava moralmente certo; mas, na maioria dos casos, era possível, se se admitir o trabalho da imaginação, ver o que se quisesse na vaga moldagem que se defrontava. Foi talvez o que ocorreu no grupo de Eddy: realmente C. C. Massey, um juiz muito competente, em sessão com Eddy em 1875, queixava-se desse fato. O verdadeiro milagre não era a identidade, mas a simples presença do ser.
Não há dúvida que o interesse despertado pela imprensa, ao relatar os fenômenos de Eddy, deveria ter produzido um mais sério tratamento da ciência psíquica e, possivelmente, adiantado de uma geração a causa da verdade. Infelizmente, no momento exato em que a atenção do público era atraída para o assunto, sobreveio real ou imaginário – o escândalo dos Holmes em Filadélfia, o qual foi rigorosamente explorado pelos materialistas, ajudados pela exagerada honestidade de Robert Dale Owen. Os fatos foram os seguintes:
Dois médiuns em Filadélfia Mr. e Mrs. Nelson Holmes, tinham feito uma série de sessões, nas quais supostamente aparecia, de contínuo, um Espírito que havia tomado o nome de Katie King, declarando-se a mesma com que o Professor William Crookes havia feito experiências em Londres. Em face disto a afirmação tornou-se duvidosa, desde que a original Katie King havia dito que a sua missão estava concluída. Entretanto, de lado a identidade do Espírito, parece que havia fortes indícios de que o fenômeno fosse genuíno e não fraudulento, por ser geralmente endossado por Mr. Dale Owen, pelo General Lisitt e por vários outros observadores, que citaram experiências pessoais acima de qualquer suspeita.
Havia então em Filadélfia um certo Doutor Child, que representou um papel muito ambíguo nos fatos obscuros que se seguiram. Child tinha sustentado a autenticidade dos fenômenos de maneira pronunciada. Chegara a ponto de declarar, num folheto que publicou em 1874, que o próprio James, como Katie King, que ele vira na sala das sessões, tinham vindo ao seu próprio consultório e aí haviam ditado particularidades de sua vida terrena, o que também foi publicado. Tais declarações, naturalmente, levantam dúvidas no espírito de qualquer estudante de psiquismo, porque uma forma espiritual só se manifesta através de um médium, e não há indício de que Child o fosse. De qualquer modo pode-se imaginar que, depois de uma tal asserção, Child seria a última criatura no mundo com autoridade para dizer que as sessões eram fraudulentas.
Um grande interesse público tinha sido despertado por um artigo do General Lisitt, em Galaxy de dezembro de 1874 e por um outro de Dale Owen no Atlantic Monthly, de janeiro de 1875. Subitamente a coisa estourou. Foi prenunciada por uma notícia publicada por Dale Owen a 5 de janeiro, dizendo que lhe tinham sido apresentadas provas que o obrigavam a retirar as expressões de confiança nos Holmes. Coisa semelhante fez o Doutor Child.
Escrevendo a Olcott, o qual, depois de sua investigação com Eddy, era considerado uma autoridade, disse Dale Owen:
“Penso que ultimamente eles nos mistificaram, talvez apenas misturando o bom e o falso, o que levanta dúvidas sobre as manifestações do último verão. Assim, provavelmente não as empregarei em meu próximo livro sobre Espiritismo. É uma perda, mas você e Mr. Crookes têm contribuído o bastante para o Espiritismo.”
A posição de Dale Owen é bastante clara, desde que era um homem de honra muito sensível, horrorizado com a idéia de que, por um instante, pudesse ter atestado que uma impostura era uma verdade. Parece que o seu erro repousa na circunstância de ter agido ao primeiro cicio de suspeita, em vez de esperar que os fatos se esclarecessem. A posição do Doutor Child, entretanto, é mais discutível, pois se as manifestações realmente fossem fraudulentas, como poderia ele ter tido entrevistas sozinho com os mesmos Espíritos em seu consultório?
Foi então verificado que uma senhora, cujo nome não foi dado, tinha estado representando Katie King nas sessões; que havia consentido que seu retrato fosse tirado e vendido como Katie King, que podia mostrar os vestidos e enfeites usados por Katie King nas sessões e que estava pronta para fazer uma confissão plena. Nada parecia mais desesperador e mais completo. Foi nessa altura que Olcott tomou a investigação e parece que estava preparado para verificar que a opinião geral era certa.
Logo as suas investigações revelaram alguns fatos que, entretanto, lançaram uma luz nova sobre a questão, provando que, a fim de ser minuciosa e exata, a pesquisa psíquica deve examinar as “imposturas” com o mesmo senso crítico que aplica aos fenômenos. O nome da pessoa que tinha confessado haver representado o papel de Katie King foi declinado: era Elisa White. Numa declaração que ela publicou, sem dar o nome, disse haver nascido em 1851, o que lhe dava então vinte e três anos de idade. Tinha-se casado aos quinze e tinha um filho de oito anos. Seu marido havia morrido em 1872 e ela devia sustentar-se e ao filho. Desde março de 1874 os Holmes moravam na mesma casa que ela. Em maio a contrataram para representar o Espírito. A cabine tinha uma parede falsa na parte posterior, por onde ela podia insinuar-se vestida de musselina. Mr. Dale Owen tinha sido convidado para as sessões e ficara inteiramente empolgado. Tudo isto resultou-lhe num drama de consciência, que, todavia, não a impediu de arriscar-se a maiores cometimentos, tais como os de aprender a desvanecer-se ou mudar de forma, por meio de panos pretos ou fazer-se fotografar como Katie King.
Um dia, de acordo com o seu relato, veio à sua sessão um homem chamado Leslie, empreiteiro de estrada de ferro. Esse cavalheiro mostrou suspeitas e na sessão seguinte revelou-lhe a sua fraude, e lhe ofereceu auxílio em dinheiro se ela o confessasse. Aceitou e mostrou a Leslie os seus métodos de mistificação. A 5 de dezembro foi realizada uma sessão fraudulenta, na qual ela representou seu papel como nas sessões reais. Isto impressionou de tal modo a Dale Owen e ao Doutor Child, que se achavam presentes, que publicaram aquelas notícias nas quais reconsideravam a sua crença – e essa reconsideração foi um golpe naqueles que acreditavam nas primeiras declarações de Dale Owen e que agora entendiam que ele deveria ter feito uma investigação mais completa, antes de sustentar tais coisas. A coisa era tanto mais penosa quanto Dale Owen contava setenta e três anos de idade e tinha sido um dos mais eloqüentes e corajosos discípulos da nova dispensação.
A primeira tarefa de Olcott foi examinar cuidadosamente as declarações já feitas e destruir o anonimato de sua autora. Logo descobriu, como foi dito, que era Elisa White e que, conquanto em Filadélfia, recusou-se a recebê-lo. Por outro lado os Holmes agiram muito abertamente e se ofereceram para criar todas as facilidades de examinar os seus fenômenos em quaisquer condições que lhes aprouvesse. Uma investigação sobre o passado de Elisa White mostrou que seu depoimento, no que diz respeito à sua pessoa, era uma teia de mentiras. Ela era muito mais velha do que dissera – não tinha menos de trinta e cinco anos – e não é certo de que um dia se tivesse casado com White. Durante anos tinha sido vocalista numa companhia ambulante. White ainda era vivo, de modo que não havia a questão da viuvez. Olcott publicou um atestado do Chefe de Polícia a tal respeito.
Entre outros documentos fornecidos pelo Coronel Olcott estava um de Mr. Allen, Juiz de Paz de New Jersey, dado sob juramento. Elisa White, conforme essa testemunha, era “tão indigna de crédito que aqueles a quem falava nunca sabiam se deviam acreditar, e sua reputação moral era tão ruim quanto possível.” Contudo o Juiz Allen pôde dar um depoimento mais diretamente referido ao assunto em discussão. Declarou que havia visitado os Holmes em Filadélfia e tinha visto o Doutor Child preparar a cabine, que era solidamente construída e que não havia possibilidade de qualquer entrada pelos fundos, como dissera Mrs. White. Além disso, que estivera na sessão em que aparecera Katie King e que os trabalhos haviam sido interrompidos pelo canto de Mrs. White num outro quarto, de modo que era impossível que Mrs. White pudesse, como dizia, ter feito o papel de um Espírito. Sendo este um depoimento jurado de um Juiz de Paz, parece uma peça de peso como prova.
Parece que a cabine foi feita em junho, pois o General Lisitt, excelente testemunha, descreveu um dispositivo bem diferente quando assistiu às experiências. Diz ele que duas portas se dobravam em harmônica, de modo que se tocavam; a cabine era apenas o recanto formado por elas e um quadro por cima. “Nas primeiras duas ou três sessões fiz um exame minucioso, e uma vez com um mágico profissional, que ficou perfeitamente satisfeito por não haver possibilidade de truques”. Isto foi em maio, de modo que as duas descrições não são contraditórias – salvo quanto à declaração de Elisa White de que podia deslizar para dentro da cabine.
Além dessas razões para precauções ao formar opinião, os Holmes foram capazes de exibir cartas que lhes foram escritas por Mrs. White, em agosto de 1874, onde se vê a incompatibilidade para a existência entre eles de qualquer segredo criminoso. Por outro lado, uma dessas cartas disse que haviam sido feitos esforços para que ela forjasse uma confissão de que tinha sido Katie King. Mais tarde no mesmo ano, parece que Mrs. White assumiu um tom mais ameaçador, conforme um depoimento escrito e formal dos Holmes, quando ela declarou que, a menos que lhe pagassem uma pensão determinada, havia um bom número de cavalheiros ricos, inclusive membros da Associação Cristã de Moços, que estavam prontos para lhe pagar uma larga soma e que ela não mais incomodaria os Holmes. Mil dólares era a soma exata que Elisa White iria receber se concordasse em admitir que tinha representado Katie King. Certamente há que convir que tal verificação, em conjunto com as declarações da mulher, exige que se peçam provas de tudo quanto ela diz.
Resta um fato culminante. Na hora exata em que a falsa sessão foi realizada e na qual Mrs. White estava mostrando como Katie King era representada, os Holmes realizavam uma sessão real, assistida por vinte pessoas e na qual o Espírito apareceu da maneira de sempre. O Coronel Olcott recolheu várias declarações de pessoas então presentes e não há dúvida a respeito do fato. A do Doutor Adolphus Fellger é curta e pode ser dada quase que por inteiro.
Diz ele sob juramento que “viu o Espírito conhecido como Katie King, ao todo, cerca de oito vezes; é perfeitamente familiar com os seus modos e não se sente enganado em relação à identidade de Katie King, que apareceu na tarde de 5 de dezembro, pois enquanto o dito Espírito aparecia exatamente da mesma altura e com os mesmos gestos, em duas sessões seguidas, sua voz era sempre a mesma e a expressão de seus olhos e os tópicos da conversa lhe davam maior certeza de tratar-se da mesma pessoa”. Esse Fellger era muito conhecido e respeitado em Filadélfia como médico, cuja palavra simples, no dizer de Olcott, vale mais que “vinte juramentos escritos da vossa Elisa White”.
Também ficou demonstrado que Katie King aparecia constantemente quando Mrs. Holmes estava em Blissfield e Mrs. White em Filadélfia e que Mrs. Holmes havia escrito a Mrs. White descrevendo suas aparições reais, o que parece uma prova final de que a última não era uma parceira.
Por esse tempo deve admitir-se que a confissão anônima de Mrs. White é um tiro numa coisa furada e com tantos buracos que a coisa se afunda. Há, porém, um detalhe que, na opinião do autor, ainda flutua. É o caso da fotografia. Foi confessado pelos Holmes, numa entrevista com o General Lisitt, – cuja palavra é um pedaço sólido naquele charco – que Elisa White foi contratada pelo Doutor Child para posar num retrato como Katie King. Parece que Child representou um papel dúplice em todo esse negócio, fazendo, em diferentes ocasiões, afirmações muito contraditórias e tendo, ao que parece, um interesse pecuniário no caso. Por isso a gente se inclina a considerar seriamente essa acusação, e pensar se os Holmes teriam participado da fraude. Garantindo que a imagem de Katie King era real, talvez tivessem duvidado se ela seria ou não fotografável, de vez que sua produção exigia que a luz fosse fraca. Por outro lado, havia uma clara fonte de lucro, desde que os retratos eram vendidos aos numerosos assistentes por meio dólar. Em seu livro, o Coronel Olcott reproduz a fotografia de Mrs. White ao lado de outra supostamente de Katie King, e chama a atenção para a falta de semelhança. É claro, entretanto, que tivessem solicitado ao fotógrafo que a retocasse, para disfarçar a semelhança, pois do contrário a fraude seria notada. O autor tem a impressão, que não é certeza, de que os dois rostos são os mesmos, apenas com algumas alterações obtidas pela manipulação. Assim, admite que a fotografia seja fraudulenta, mas isto de modo algum corrobora o resto da narrativa de Mrs. White, muito embora abale a nossa fé a respeito do caráter de Mr. e Mrs. Holmes, do mesmo modo que do Doutor Child. Mas o caráter dos médiuns de efeitos físicos tem apenas uma influência indireta na questão da realidade de sua força psíquica, que deveria ser apreciada através de sua própria natureza, pouco importando se o indivíduo é santo ou pecador.
A sábia conclusão do Coronel Olcott foi que, à vista do conflito de provas, deveria pôr tudo de lado e controlar os médiuns à sua maneira, sem se importar com o que havia passado.
E o fez de maneira convincente, de modo que, quem quer que leia a sua investigação – “People From the Other World”, página 460 e seguintes, – não poderá negar que ele tomou todas as precauções possíveis contra as fraudes. A cabine era revestida de tela pelos lados, de modo que ninguém poderia entrar, como Mrs. White disse haver feito. Mrs. Holmes era posta num saco, atado ao pescoço e, como o marido se achava ausente, ficava reduzida aos seus próprios recursos. Em tais circunstâncias numerosas cabeças se formaram, algumas das quais semi-materializadas, apresentando uma aparência horrível. Isto deve ter sido feito como um teste ou, possivelmente, a longa contenção deve ter prejudicado os poderes do médium. Os rostos costumavam aparecer a uma altura que o médium não podia alcançar. Dale Owen achava-se presente a essa demonstração e já deveria ter lamentado a sua declaração prematura.
Sessões posteriores e com os mesmos resultados foram realizadas por Olcott em seus próprios aposentos, de modo a eliminar a possibilidade de qualquer mecanismo sob o controle do médium. Numa ocasião, quando a cabeça de John King, o Espírito dirigente, apareceu no ar, Olcott, lembrando-se da declaração de Elisa White, de que esses rostos eram apenas máscaras de dez centavos, pediu e obteve permissão para passar a sua bengala em redor dele, e assim ficou satisfeito de verificar que não era sustentado por ninguém. Essa experiência parece tão conclusiva que o leitor que pretender mais provas deve ser remetido ao livro onde encontrará muito mais. Era claro que, qualquer que fosse o papel representado por Elisa White na fotografia, não havia sombra de dúvida de que Mrs. Holmes era um médium genuíno e poderoso para fenômenos de materializações. Deveria acrescentar-se que a cabeça de Katie King foi vista repetidas vezes pelos investigadores, conquanto a forma inteira, ao que parece, só se materializou uma vez. O General Lisitt estava presente a essa reunião e associou-se publicamente, pela Banner of Light de 6 de fevereiro de 1875, às conclusões de Olcott.
O autor demorou-se um pouco sobre esse caso porque o mesmo representa a maneira típica pela qual o povo é desviado do Espiritismo. Os jornais estão cheios de “desmascaramentos”. A coisa é investigada e tanto se mostra o que é falso, quanto o que é parcialmente verdadeiro. Isto não é publicado e o público fica com a primeira impressão incorreta. Mesmo agora, quando se menciona Katie King, é freqüente essa crítica: “Foi provado que era uma fraude, em Filadélfia”, e, por uma natural confusão de idéias, isto foi até usado como argumento contra as experiências clássicas de Crookes. A questão – especialmente a momentânea fraqueza de Dale Owen – atrasou de muitos anos o Espiritismo na América.
Foi feita uma referência a Jehn King, o Espírito dirigente das sessões dos Holmes. Essa estranha entidade parece ter sido o principal controlador de todos os fenômenos físicos nos primeiros dias do movimento e ainda é visto e ouvido ocasionalmente. Seu nome está ligado com o salão de música de Koons, com os irmãos Davenport, com Williams em Londres, com Mrs. Holmes e muitos outros. Pessoalmente, quando materializado, tem aparência de um homem alto, moreno, uma cabeça nobre e grande barba negra. Sua voz é alta e profunda, enquanto as suas batidas têm um caráter peculiar. É senhor de todas as línguas, tendo sido experimentado nas línguas mais originais, como o georgiano, e nunca foi pilhado em erro.
Essa criatura formidável controla bandos de Espíritos inferiores, índios Peles-Vermelhas e outros, que assistem a tais fenômenos. Afirma que Katie King é sua filha e que em vida, como Henry Morgan, fora pirata, perdoado e armado cavaleiro por Carlos 2º e que terminara como Governador da Jamaica. Se assim foi, teria sido um rufião crudelíssimo, que muito terá que expiar. Contudo, o autor deve declarar que possui um retrato de Henry Morgan, feito na época – e que se encontra na obra de Howard Pyles “Buccaneers”, à página 178, e que, se controlada, nenhuma semelhança apresenta com John King. Todas estas questões de identificação material são muito obscuras.
Antes de encerrar o relato das experiências de Olcott, nessa etapa de sua evolução, deve ser feita uma referência ao caso da chamada transfiguração de Compton, que mostra em que águas profundas nos encontramos quando tentamos pesquisas psíquicas. Essas profundezas ainda não foram avaliadas, nem delineadas. Nada pode ser mais claro do que os fatos, nem mais satisfatório do que as provas. A médium Mrs. Compton se achava fechada em sua cabine, com um fio passado pelos furos de suas orelhas e amarrado ao encosto de sua cadeira. Então uma esguia figura branca emergiu da cabine. Olcott tinha providenciado uma balança de plataforma, na qual o Espírito ficou de pé. Foi pesado duas vezes, registrando 35,7 quilos e 27,3 quilos respectivamente. Então, conforme as disposições prévias, Olcott foi à cabine, deixando o espectro do lado de fora. A médium tinha desaparecido. A cadeira lá estava, mas nem sinal da senhora. Então Olcott voltou e pesou novamente a aparição, que então apresentava 23,5 quilos. Depois disso o Espírito voltou à cabine, da qual surgiam outras figuras. Finalmente, diz Olcott:
“Eu ali entrei com uma lâmpada e encontrei a médium exatamente como havia deixado no começo da sessão, com os fios intactos e cada nó perfeito! Estava sentada, com a cabeça apoiada na parede, pálida e fria como mármore, os olhos revirados, a testa coberta de uma umidade de morte, sem respiração pulmonar nem batidas do pulso. Quando todos acabaram de examinar os fios e os nós frágeis eu os cortei com uma tesoura e, levantando a cadeira pelo encosto e pelo assento, transportei a senhora em catalepsia para um lugar arejado fora da câmara.
Ela ficou inanimada durante dezoito minutos. Gradativamente a vida foi voltando, até que a respiração, o pulso e a temperatura se tornaram normais... Então a levei para a balança... Pesava 55 quilos!”
Que fazer de tais resultados? Havia onze testemunhas além de Olcott. Os fatos parecem acima de dúvidas. Mas, que deduzir deles? O autor viu uma fotografia, tomada em presença de um médium amador, na qual todos os detalhes da sala tinham sido apanhados, mas a médium havia desaparecido. O desaparecimento da médium tem alguma analogia com esse caso? Se a figura ectoplásmica só pesava 35 quilos e a médium 55, torna-se claro que apenas 20 quilos lhe eram deixados, quando o fantasma estava fora. Se 20 quilos não bastavam para continuar o processo de vida, não poderiam os seus guias ter usado a sua química oculta sutil a fim de a desmaterializar e assim salvá-la do perigo até que a volta do fantasma permitisse a reabsorção? É uma estranha suposição, mas parece que atende aos fatos – o que pode ser feito por mero palpite ou por uma incredulidade não raciocinada.

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