sábado, 30 de maio de 2009

Artigo sobre a índole de D. D. Home, questionado por D. Franco

Link para artigo publicado no blog do Dr. Iso Jorge,
Médico. Psiquiatra. Professor Livre-Docente de Psicopatologia e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

http://www.terraespiritual.locaweb.c om.br/espiritismo/artigo1400.html

Livros sobre as pesquisas com D. D. Home

http://www.spiritwritings.com/AdareExperiences.pdf
http://82.75.145.16/pdfbooks/Incidents%20In%20My%20Life-D%5B1%5D.D.%20Home.pdf

Cap. 9 - A Carreira de Daniel Dunglas Home

Daniel Dunglas Home nasceu em 1833 em Currie, uma aldeia perto de Edimburgo.
Havia um mistério relativamente à sua ascendência: tanto se afirmava, quanto se negava que fosse, de certo modo, da família do Conde de Home. Na verdade foi um homem que herdou um tipo elegante, maneiras delicadas, disposição sensível e um gosto para o luxo, fosse de que fonte fosse. Mas pela sua força psíquica e pelo entusiasmo que esta comunicou ao seu caráter complexo, ele podia ser realmente tomado como o tipo exato de um caçula aristocrata, que herda as tendências, mas não a riqueza dos pais.
Home saiu da Escócia para a Nova Inglaterra aos nove anos de idade, com uma tia que o havia adotado, outro mistério que lhe cercava a existência. Aos treze anos de idade começou a mostrar as faculdades psíquicas herdadas de sua mãe, descendente de velha família de Highland e que possuía a faculdade de previsão característica de sua raça. Sua tendência mística revelou-se numa conversa com um colega, chamado Edwin, acerca de uma história, na qual fora feito um pacto em consequência do qual a criatura amada mostrar-se-ia à outra depois da morte. Do mesmo modo os dois rapazes fizeram o pacto de se mostrar um ao outro. Home mudou-se para outro distrito, a algumas milhas de distância e, um mês mais tarde, certa noite, assim que foi para a cama, teve a visão de Edwin e anunciou à sua tia a morte do rapaz, do que tiveram informação um ou dois dias depois. Uma segunda visão, em 1850, referia-se à morte de sua mãe, que tinha ido com o marido viver na América. Nessa ocasião o rapaz se achava acamado e sua mãe se achava fora, em visita a amigos distantes.
Uma noite ele gritou por socorro e quando a tia chegou encontrou-o muito abatido.
Disse que a mãe havia morrido naquele dia às doze horas; que ela lhe havia aparecido e dado aviso. Em breve batidas fortes começaram a perturbar aquele lar quieto e os móveis a serem arrastados por forças invisíveis. Sua tia, criatura de estreita visão religiosa, disse que o rapaz havia trazido o Diabo para casa e jogou-o na rua.
Ele refugiou-se com os amigos e nos anos seguintes passava da casa de um para a de outro, de cidade em cidade. Sua mediunidade se havia desenvolvido poderosamente e nas casas em que se hospedava realizava frequentes sessões, às vezes seis ou sete por dia, pois as limitações da força e as reações entre o físico e o psíquico eram então mal compreendidas.
Isto lhe produzia grande perda de forças, e frequentemente o levava para a cama.
Multidões acorriam de todos os lados para presenciar as maravilhas que se produziam na presença de Home. Entre os que então investigaram com ele estava o poeta americano Bryant, que era acompanhado pelo Professor Wells, da Universidade de Harvard. Em New York encontrou muitos americanos distintos, dos quais três fizeram sessões com ele: o Professor Hare, o Professor Mapes e o Juiz Edmonds, da Suprema Corte de New York. Estes três, como ficou dito, tornaram-se espiritistas convictos.
Nesses primeiros anos o encanto da personalidade de Home e a profunda impressão criada por sua força permitiram que recebesse muitas ofertas. O Professor George Bush convidou-o para sua companhia, a fim de estudar para ministro swedenborgiano; Mr. e Mrs. Elmer, um rico casal sem filhos, que lhe haviam tomado grande afeição, ofereceram-se para adotá-lo e fazê-lo seu herdeiro, com a condição de trocar o nome pelo de Elmer.
Seu notável poder curador tinha excitado a admiração e, persuadido pelos amigos, começou a estudar medicina. Mas a sua saúde delicada, complicada com uma afecção pulmonar, forçou-o a abandonar os seus planos e, a conselho médico, deixou New York e foi para a Inglaterra.
Chegou a Liverpool a 9 de abril de 1855, e foi descrito como um jovem alto, esguio, de marcada elegância e exagerada limpeza do vestir, mas com um olhar típico e uma expressão que traía a devastação feita pela moléstia. Tinha os olhos azuis e os cabelos castanhos; era desse tipo facilmente sujeito a tuberculose e a extrema emaciação mostrava quanto era insignificante a sua capacidade de resistência. Um médico, bom observador, certamente lhe faria um prognóstico de apenas uns meses de vida, num clima úmido como o nosso e de todas as maravilhas que Home realizava, o prolongamento da sua vida certamente não foi das menores. Seu caráter já havia tomado aqueles traços emocionais e religiosos que o distinguiam e ele recordou como, antes de desembarcar, correu para o seu camarote e ajoelhou-se em prece. Quando a gente considera a admirável carreira que se abre à sua frente e o grande papel que ele desempenhou no estabelecimento das bases materiais que diferenciam esse movimento religioso de qualquer outro, pode-se proclamar que esse visitante estava entre os mais notáveis missionários que jamais apareceram por estas plagas.
No momento a sua posição era muito singular. Tinha uma relação difícil com o mundo.
Seu pulmão esquerdo estava parcialmente destruído. Seus recursos eram modestos, embora suficientes. Não tinha negócios nem profissão e sua educação havia sido interrompida pela doença. De caráter desconfiado, gentil, sentimental, artístico, afetuoso e profundamente religioso, tinha uma profunda tendência para a Arte e para o Drama. Assim, a sua capacidade para a escultura era considerável e como declamador provou mais tarde que pouca gente o igualava. Mas acima de tudo isto, de uma honestidade inflexível e tão rigorosa que por vezes chegava a ofender aos seus aliados, havia um dom tão admirável que apagava todos os demais. Este repousa naquelas forças, muito independentes de sua vontade, que iam e vinham com desconcertante subtaneidade, mas demonstrando a todos que examinassem a prova, que havia algo na atmosfera desse homem que permitia que as forças a ele exteriores, como exteriores à nossa percepção, se manifestassem neste plano da matéria. Por outras palavras, ele era um médium – o maior que o mundo moderno já viu, no campo das manifestações físicas.
Um homem inferior teria usado os seus poderes extraordinários para fundar uma seita especial, da qual teria sido o sumo sacerdote inconteste, ou para se rodear de uma auréola de poder e de mistério. Certamente muita gente na sua posição teria sido tentada a usar aqueles dons para fazer dinheiro. Em relação a este ponto seja dito, antes de tudo, que no curso de seus trinta anos de estranho ministério, jamais ele tocou num tostão como paga de seus dons. É absolutamente certo que lhe foram oferecidas duas mil libras pelo Clube União, em Paris, no ano de 1857, por uma única sessão, e que ele, pobre e inválido, as recusou terminantemente. “Fui mandado em missão”, disse ele. “Essa missão é demonstrar a imortalidade. Nunca recebi dinheiro por isso e jamais o receberei”. Houve certos presentes da Realeza que não podiam ser recusados sem grosseria: anéis, alfinetes de gravatas e outros, que mais eram sinais de amizade do que recompensa; porque, antes de sua morte prematura, poucos eram os monarcas da Europa com os quais esse moço desconfiado de um subúrbio de Liverpool não estivesse em afetuosa intimidade. Napoleão 3º cuidou de sua única irmã; o Imperador da Rússia foi testemunha de seu casamento. Qual o novelista que seria capaz de inventar uma tal carreira?
Há, porém, tentações mais sutis do que as da riqueza. A inquestionável honestidade de Home foi a melhor salvaguarda contra aquelas. Jamais ele perdeu, por um só instante, a sua humildade e o seu senso de proporção. “Tenho esses poderes”, teria ele dito, “serei feliz até o limite de minhas forças, eu vo-los demonstrar, se vos aproximardes de mim, do mesmo modo que um cavalheiro se aproximaria de outro. Alegrar-me-ei se lançardes um pouco mais de luz sobre elas. Prestar-me-ei a qualquer experiência razoável. Eu não exerço controle sobre elas. Elas me usam, mas eu não as uso. Elas me abandonam durante meses e voltam com redobrada energia. Eu sou um instrumento passivo – nada mais.” Tal era a sua atitude invariável. Ele era sempre o homem mundano fácil e amigo, que nem tinha o manto do profeta nem o turbante do mágico. Como os homens realmente grandes, não havia em sua natureza o mínimo de pose. Um indício de sua elegância é que, sempre que devia confirmar os seus resultados, jamais citava nomes, a menos que estivesse absolutamente certo de que as pessoas citadas de modo algum se incomodariam em ser referidas a um culto impopular. Por vezes, ainda quando estas lhe houvessem autorizado a citá-las, evitava fazê-lo, com receio de ofender a um amigo. Quando publicou as primeiras séries dos “Incidentes em minha Vida”, o Saturday Review cobriu de sarcasmos o anônimo “Testemunho da Condessa O... do Conde B... do Conde de K... da Princesa de B... e de Mrs. E... que eram apontados como tendo assistido às manifestações. Em seu segundo volume, tendo-se assegurado do apoio de seus amigos, Home preencheu os claros com os nomes da Condessa Orsini, do Conde de Beaumont, do Conde de Komar, da Princesa de Beauveau e a conhecida dama americana Mrs. Henry Senior. Jamais citou os seus amigos reais, embora fosse muito sabido que o Imperador Napoleão e Imperatriz Eugênia, o Czar Alexandre, o Imperador Guilherme 1º da Alemanha e os Reis da Baviera e do Wurtemberg também haviam sido convencidos por suas forças extraordinárias. Nem uma só vez Home foi condenado por qualquer mistificação, quer por palavras, quer por atos.
Por ocasião de sua primeira viagem à Inglaterra, hospedou-se no Cox’s Hotel, em Jermyn Street, e é provável que tenha escolhido essa hospedaria por ter sabido, através de Mrs. Hayden, que o seu proprietário era simpático à causa. Como quer que seja, Mr. Cox logo descobriu que o seu jovem hóspede era o mais notável médium e, a seu convite, os mais notáveis intelectuais do momento foram convidados a examinar os fenômenos que Home lhes poderia exibir. Entre outros, Lord Brougham veio à sessão e trouxe um cientista seu amigo, Sir David Brewster. Em plena luz do dia investigaram os fenômenos e na sua satisfação pelo que se havia passado, ao que se conta, teria dito Brewster: “Isto derrota a filosofia de cinqüenta anos”. Se ele tivesse dito “mil e quinhentos” ter-se-ia aproximado da marca. Ele descreve o que aconteceu numa carta à sua irmã, só muito mais tarde publicada.
Estavam presentes Lord Brougham, Sir David Brewster, Mr. Cox e o médium.
“Nós quatro”, disse Brewster, “sentamo-nos a uma mesa de tamanho regular, e cuja estrutura nos tinham convidado a examinar. Em pouco tempo a mesa fez esforços e um tremor percorreu os nossos braços; esses movimentos cessavam e recomeçavam ao nosso comando. As mais incontáveis batidas se produziram em várias partes da mesa e esta se ergueu do chão quando não havia mãos sobre ela. Outra mesa maior foi utilizada e produziu os mesmos movimentos.
“Uma pequena sineta foi posta no chão, sobre o tapete, de boca para baixo; depois de algum tempo ela soou sem que ninguém a tivesse tocado.”
Acrescenta ele que a sineta veio para ele e se colocou em suas mãos; depois fez o mesmo com Lord Brougham. E conclui: “Estas foram as principais experiências. Não poderíamos explicá-las nem imaginar por que espécie de mecanismo poderiam ter sido produzidas.”
Declara o Conde de Dunraven que foi levado a investigar os fenômenos pelo que Brewster lhe havia contado. Descreve o encontro com este último, que dizia serem as manifestações inexplicáveis pela fraude, ou por quaisquer leis de física de nosso conhecimento. Home remeteu uma descrição dessa sessão a um amigo na América, onde a mesma foi publicada e comentada. Quando os comentários foram reproduzidos na imprensa inglesa, Brewster ficou muito alarmado. Uma coisa é sustentar certas idéias na intimidade e outra enfrentar a inevitável perda de prestígio, que ocorreria nos meios científicos em que se achava. Sir David não era daquele estofo de que são feitos os mártires e os pioneiros.
Escreveu ao Morning Advertiser, declarando que, embora tivesse visto vários efeitos mecânicos que não poderia explicar, ainda era de opinião que os mesmos poderiam ser produzidos por pés e mãos humanos. Aliás jamais lhe ocorrera que a carta escrita à sua irmã, a que acima nos referimos, um dia fosse publicada.
Quando toda a correspondência foi publicada, o Spectator observou, em relação a Sir David Brewster:
“Parece estabelecido pela mais clara prova que ele sentiu e descreveu, logo depois de suas sessões com Mr. Home, uma maravilha e quase terror, que depois desejou explicar. O herói da ciência não se absolve como a gente desejaria, ou como era de esperar.”
Abordamos ligeiramente o incidente com Brewster porque é típico da atitude científica de então e porque o seu efeito era despertar um maior interesse em Home e seus fenômenos, e acordar novos investigadores. Pode alguém lembrar que os homens de ciência se dividem em três classes: os que absolutamente não examinaram o assunto – o que não os impede de pronunciar opiniões muito violentas; os que sabem que a coisa é verdadeira, mas temem confessá-lo; e, finalmente, a brilhante minoria dos Lodges, dos Crookes, dos Barretts e dos Lombrosos, que sabem que é verdade e não temem proclamá-lo.
De Jermyn Street, Home foi morar com a família Rymer, em Ealing, onde foram realizadas muitas sessões. Aí foi visitado por Lord Lytton, o famoso novelista que, muito embora tivesse recebido notáveis provas, jamais confessou publicamente a sua crença nos poderes do médium, a despeito de suas cartas particulares e das novelas publicadas constituírem provas evidentes de seu modo de sentir. Assim acontecia com muitos homens e senhoras bem conhecidos. Entre os seus primeiros assistentes estavam o Socialista Robert Owen, o escritor T. A. Trollope e o alienista Doutor J. Garth Wilkinson.
Nestes dias, quando os fenômenos psíquicos são familiares a todos, exceto aos que propositadamente os ignoram, dificilmente podemos imaginar a coragem moral necessária a Home para desenvolver as suas forças e as exibir em público. Para o britânico de educação média na material época Vitoriana, um homem que se dissesse capaz de produzir fenômenos que contrariassem a lei da gravidade de Newton e que mostrasse uma inteligência invisível atuando sobre a matéria visível era, de saída, julgado um tratante e um impostor. O ponto de vista sobre o Espiritismo, externado pelo vice-chanceler Giffard, na conclusão do processo Home-Lyon, era o da classe a que ele pertencia. Nada conhecia sobre o assunto, mas tomou como certo que tudo nesse particular era falso. É verdade que semelhantes coisas eram descritas em terras distantes e em livros antigos, mas que elas pudessem ocorrer na velha e sólida Inglaterra prosaica, na Inglaterra de dividendos bancários e de livre câmbio, era demasiadamente absurdo para uma mentalidade séria. Foi lembrado que nesse processo Lord Giffard virou-se para o advogado de Home e perguntou: “Parece-me que o senhor sustenta que o seu cliente foi levitado no ar?” O advogado o confirmou e então o juiz voltou-se para o júri e fez um tal movimento, como o teria feito um sumo sacerdote, rasgando suas vestes talares em sinal de protesto contra a blasfêmia. Em 1868, havia poucas pessoas do júri suficientemente educadas para verificar as observações do juiz, e é exatamente neste particular que fizemos algum progresso nestes cinqüenta anos. Trabalho lento – mas o Cristianismo levou mais de três séculos para se firmar.
Tome-se este caso de levitação de Home como um teste de seu poder. Sustenta-se que por mais de cem vezes, perante testemunhas respeitáveis, ele flutuou no ar. Considere-se a prova. Em 1857, num castelo perto de Bordéos, ele foi erguido até o teto de um salão alto, em presença de Madame Ducos, viúva do Ministro da Marinha e do Conde e da Condessa de Beaumont. Em 1860 Robert Bell escreveu um artigo, no Cornhill, sob o título de “Mais estranho do que uma ficção”, no qual diz que “foi erguido de sua cadeira quatro a cinco pés do solo... Vimos o seu corpo passar de um para o outro lado da janela, com os pés para frente, posto horizontalmente no ar”. O Doutor Gully, de Malvern, médico muito conhecido, e Robert Chambers, autor e editor, eram outras testemunhas. Pode-se admitir que esses homens mentissem por deliberado acordo ou que não soubessem dizer se um homem flutuava no ar ou apenas pretendia fazê-lo?
No mesmo ano Home foi levantado em casa de Mis. Milner Gibson, em presença de Lord e Lady Clarence Paget, tendo o Lord passado as mãos por baixo de Home, a fim de se certificar do fato. Poucos meses mais tarde, Mr. Wason, advogado de Liverpool, com sete outros, assistiram ao mesmo fenômeno. Diz ele:
“Mr. Home atravessou a mesa, passando por cima das cabeças das pessoas sentadas em sua volta”. E acrescenta: “Alcancei a sua mão a sete pés do solo e dei cinco ou seis passos enquanto ele flutuava no espaço, acima de mim.” Em 1861 Mrs. Parkes, de Cornwald Terrace, Regent’s Park, conta como se achava presente, com Bulwer Lytton e Mr. Hall, quando Home, em sua própria sala de visitas, foi levantado até que a mão chegou ao alto da porta e então flutuou horizontalmente. Em 1866 Mr. e Mrs. Hall, Lady Dunsany e Mrs. Senior, em casa de Mr. Hall, viram Home, com o rosto transfigurado e brilhante, erguer-se duas vezes até o teto e deixar uma cruz, feita com lápis, na segunda levitação, de modo a assegurar às testemunhas que não eram vítimas de sua própria imaginação.
Em 1868 Lord Adare, Lord Lindsay, o Capitão Wynne e Mr. Smith Barry viram Home levitado várias vezes. Uma descrição minuciosa foi deixada pela primeira daquelas testemunhas da ocorrência de 16 de dezembro daquele ano, quando em Ashley House, em estado de transe, Home flutuou do quarto para a sala de estar, passando pela janela, a setenta pés acima da rua. Depois de chegar à sala, voltou para o quarto com Lord Adare e, depois que este observou que não compreendia como Home poderia ter passado pela janela, apenas parcialmente levantada, “ele me disse que se afastasse um pouco. Então passou pelo espaço aberto, primeiro a cabeça, muito rapidamente, estando o seu corpo aparentemente rígido e quase na horizontal. Voltou novamente, com os pés para frente”. Tal a informação dada por Lord Adare e Lord Lindsay. Diante de sua publicação, o Doutor Carpenter, que gozava de uma reputação nada invejável por uma perversa oposição a tudo quanto se relacionava com este assunto, escreveu exultante indicando que havia uma terceira testemunha que não tinha sido ouvida, admitindo sem o menor fundamento que o depoimento do Capitão Wynne seria em sentido contrário. Por fim disse que “um simples céptico honesto declara que Mr. Home esteve sentado todo o tempo em sua cadeira” afirmação que apenas pode ser tomada como falsa. Então o Capitão Wynne escreveu corroborando os outros depoimentos e acrescentando:
“Se o senhor não acredita na prova corroborante de três testemunhas insuspeitas, então será o fim de toda a justiça e das cortes da lei”.
Para ver quanto a crítica procurou uma saída para escapar ao inevitável, basta dizer que ela se agarrou ao que Lord Lindsay escreveu algum tempo depois, dizendo que a coisa tinha sido vista à luz da Lua. Entretanto o calendário mostra que naquele dia a Lua era invisível. Observa Mr. Andrew Lang:
“Entretanto, mesmo com cerração, a gente numa sala pode ver um homem entrar por uma janela e sair novamente, com a cabeça para frente, com o corpo rígido”.
A todos nós parece que se víssemos uma coisa tão maravilhosa, não nos preocuparíamos em determinar se a víamos à luz da Lua ou de lâmpadas da rua. Contudo deve-se admitir que a descrição de Lord Lindsay é redigida grosseiramente – tão grosseiramente que a gente quase desculpa Mr. Joseph Mc Cabe, quando diz numa conferência que os observadores não olhavam a coisa diretamente e a sua sombra no peitoril da janela, mas que se achavam de costas para a janela e apenas viam a sombra da coisa na parede. Entretanto, quando a gente considera a segurança das três testemunhas de vista que depuseram sobre o caso, tem o direito de perguntar se, quer no passado, quer no presente, qualquer fato extraordinário já foi mais claramente provado.
Tantos são os outros casos de levitação de Home que facilmente seria escrito um longo artigo sobre este particular aspecto de sua mediunidade. O Professor Crookes foi outras tantas vezes testemunha do fenômeno e se refere a cinqüenta exemplos que haviam chegado ao seu conhecimento. Haverá porém alguém de cérebro equilibrado que, tendo lido o incidente aqui referido, não diga, com o Professor Challis: “Ou os fatos devem ser admitidos tais quais são relatados, ou devemos dizer adeus à possibilidade de nos certificarmos de fatos através do testemunho humano”
“Voltamos, então, à era dos milagres?”, perguntará o leitor. Não há milagres. Nada neste plano é sobrenatural. Aquilo que vemos agora e o que lemos de tempos passados é apenas a operação da lei que ainda não foi bem estudada e definida. Já imaginamos algo de suas possibilidades e de suas limitações, que são tão exatas na sua maneira quanto as de qualquer força puramente física. Devemos fazer um balanço entre os que em nada acreditam e os que acreditam demais. Gradativamente a bruma se vai clarificando e poderemos definir os contornos da costa sombria. Quando pela primeira vez uma agulha foi movida pelo magneto, não houve infração às leis da gravidade. É que houve a intervenção local de outra força mais poderosa. Esse é também o caso quando as forças psíquicas atuam no plano da matéria. Se a fé que Home tinha em sua força tivesse faltado, ou se o seu círculo tivesse sido perturbado indevidamente, ele teria falhado. Quando Pedro perdeu a fé afundou-se nas ondas. Através dos séculos a mesma causa ainda produziu o mesmo efeito. A força espiritual ainda está conosco se não lhe voltamos a face e nada foi concedido à Judéia que fosse negado à Inglaterra.
A esse respeito é como uma confirmação do poder do invisível e como uma resposta final ao materialismo, tal qual o entendemos, que a carreira pública de Home é de suprema importância. Ele foi uma testemunha a afirmar a verdade daqueles chamados “milagres” que foram o pesadelo para tantas mentes espertas e agora se destinam a ser a prova sólida e forte da exatidão das narrativas primitivas. Milhões de almas em dúvida, na agonia dos conflitos espirituais reclamavam provas definitivas de que nem tudo era um vazio em redor de nós, de que havia forças fora do nosso alcance, de que o ego não era uma mera secreção do tecido nervoso e de que os mortos realmente levavam sua indestrutível existência pessoal.
Tudo isso foi provado pelo maior desses grandes missionários modernos, a qualquer um capaz de observar ou de raciocinar. É possível achar graça em mesas dançantes e em muros que tremem, mas estes foram os mais próximos e os mais naturais objetos que podiam, em termos materiais, registrar aquela força que estava acima do alcance humano. Um cérebro que fosse imobilizado por uma sentença inspirada seria levado à humildade e a novos caminhos de pesquisa em presença até do mais caseiro desses inexplicáveis fenômenos. É fácil chamá-los de pueris, mas realizaram o objetivo para que foram destinados, sacudindo em seus fundamentos a complacência daqueles materialistas homens de ciência que eram postos em contacto com eles. Eles não devem ser achados como um fim em si, mas como um meio elementar pelo qual a mente deveria ser conduzida a novos canais do pensamento. E esses canais do pensamento levaram ao reconhecimento da sobrevivência do Espírito.
“Trouxestes incalculável alegria e consolo ao coração de muita gente”, disse o Bispo Clark, de Rhode Island. “Iluminastes lugares habitados que antes eram trevas”. “Mademoiselle”, disse Home à moça que ia ser sua esposa, “há uma missão a mim confiada. Ela é grande e santa”.
O famoso Doutor Elliotson, imortalizado por Thackeray sob o nome de Doutor Goodenough, era um dos chefes do materialismo britânico. Encontrou Home, viu os seus poderes e teve a coragem de dizer imediatamente que tinha vivido toda a sua vida em trevas e pensava que nada havia na vida que não fosse material; mas que agora tinha a firme esperança que, assim pensava, haveria de alimentar enquanto vivesse.
Poderiam citar-se inúmeros exemplos do valor espiritual do trabalho de Home; mas ele jamais foi melhor sintetizado do que num período escrito por Mrs. Webster, de Florença, que viu muito da sua atuação. “Ele é o mais maravilhoso missionário dos tempos modernos e da maior de todas as causas, e o bem que ele tem feito não pode ser avaliado. Quando Mr. Home passa, derrama em seu redor a maior de todas as bênçãos – a certeza da vida futura”.
Agora que é possível conhecer detalhes de sua vida, pode-se dizer que é para o mundo inteiro que se dirige a mais vital de todas as mensagens. Sua atitude, em relação à sua própria missão, foi expressa numa conferência feita em Londres, na Sala Willis, a 15 de fevereiro de 1866. Disse ele: “Sinceramente penso que essa força aumentará cada vez mais para nos aproximar de Deus. Perguntareis se ela nos torna mais puros. Minha única resposta é que somos mortais apenas e, como tal, sujeitos ao erro. Mas ela ensina que aqueles de coração puro verão a Deus. Ela nos ensina que Deus é amor e que não há morte. Aos velhos ela vem como uma consolação, quando se aproximam as tempestades da vida e quando vem o descanso. Aos moços ela fala do dever que temos uns para com os outros e diz que colheremos o que houvermos semeado. A todos ensina resignação. Vem desfazer as nuvens do erro e trazer a manhã radiosa de um dia interminável”.
É curioso notar como a sua mensagem afetou os de sua geração. Lendo o relato de sua vida, escrita por sua esposa – um documento muito convincente, de vez que foi ela, de todas as criaturas, a que mais deveria ter conhecido o homem real – ressalta que o mais cordial apoio e o maior apreço lhe veio dos aristocratas da França e da Rússia, com os quais tinha tomado contacto. O caloroso brilho de admiração pessoal e até a reverência em suas cartas é tal, que dificilmente pode ser igualada em qualquer outra biografia. Na Inglaterra tinha ele um círculo íntimo de ardentes defensores, alguns das altas camadas sociais, como os Halts, os Howitts, Robert Chambers, Mrs. Milner Gibson, o Professor Crookes e outros. Mas havia uma lamentável falta de coragem entre estes, que admitiam os fatos na intimidade e se mantinham alheios em público. Lord Brougham e Bulwer Lytton eram do tipo de Nicodemos, principalmente o novelista. De um modo geral a “inteligência” saiu-se muito mal neste assunto e muitos nomes festejados sofreram com a história. Tyndall e Faraday foram fantasticamente anticientíficos nos seus métodos de prejulgar a questão, logo de saída, e posteriormente se ofereceram para a examinar, sob a condição de que fosse aceita a sua opinião. Sir David Brewster, como ficou dito, disse algo de honesto, e depois, em pânico, negou que o houvesse dito, esquecendo-se de que a prova já estava feita. Browning escreveu um longo poema – se é que aquilo se pode chamar poesia – descrevendo uma manifestação que jamais ocorreu. Carpenter conquistou uma notoriedade pouco invejável como opositor sem escrúpulos, ao proclamar uma singularíssima tese espírita de sua invenção. Os secretários da Sociedade Real recusaram o convite para assistirem às demonstrações de Crookes sobre os fenômenos físicos, enquanto se manifestavam terminantemente contra os mesmos. Lord Giffard despejou da Tribuna contra um súdito os primeiros elementos daquilo que ignorava.
Quanto ao clero nenhuma ordem deve ter sido dada, durante os trinta anos em que a mais maravilhosa dispensação espiritual desde muitos séculos foi dada ao público. Não é possível recordar o nome de um único clérigo britânico que tivesse mostrado um interesse inteligente.
E em 1872, quando começou a aparecer em The Times uma descrição minuciosa das sessões de São Petersburgo, a coisa foi cortada logo, segundo Mr. H. T. Humphreys, “devido às fortes queixas feitas a Mr. Delane, seu diretor, por algumas figuras da alta direção da Igreja da Inglaterra.” Tal foi a contribuição dos nossos dirigentes espirituais. O Doutor Elliotson, o nacionalista, era muito mais vivo do que eles. Eis o amargo comentário da senhora Home: “O veredicto de sua própria geração foi o do cego e do surdo contra quem vê e ouve.”
A caridade era uma das mais belas características de Home. Como toda verdadeira caridade, era secreta e só se tornava conhecida indiretamente, e por acaso. Um de seus numerosos caluniadores declarou que lhe havia endossado uma letra de cinqüenta libras em favor de seu amigo Mr. Rymer. Em legítima defesa apurou-se que não era uma letra, mas um cheque, enviado muito generosamente por Mr. Home para tirar aquele amigo de um apuro.
Considerando a sua constante pobreza, cinqüenta libras talvez representassem uma boa parte de suas reservas bancárias. Sua viúva se detém com perdoável orgulho sobre muitas provas encontradas em suas cartas, após a sua morte. “Agora é um artista desconhecido, para cujo pincel o generoso esforço de Home havia encontrado emprego; depois, é um trabalhador infeliz que escreve sobre a sua esposa doente, cuja vida foi salva pelo conforto proporcionado por Mr. Home; ou uma mãe que agradece o seu apoio para a iniciação de seu filho na vida. Quanto tempo e quanta atenção devotou ele aos outros quando as circunstâncias de sua vida levariam muitos homens a pensar apenas em si próprios e em suas necessidades.”
“Mande-me uma palavra do coração que tantas vezes soube consolar um amigo!” exclamava um de seus protegidos.
“Poderei um dia mostrar-me digno de todo o bem que você me fez?” pergunta outro numa carta.
Encontramo-lo vagando pelos campos de batalha, perto de Paris, às vezes debaixo de fogo, com os bolsos cheios de cigarros para os feridos. Um oficial alemão escreve afetuosamente para lhe lembrar como o salvou de morrer de hemorragia, carregando-o em seus fracos ombros para fora da zona de fogo. Certamente Mrs. Browning era um melhor juiz do caráter do que seu esposo e Sir Galahad um nome melhor do que Lama.
Ao mesmo tempo seria absurdo pintar Home como um caráter sem jaça. Tinha ele a fraqueza de seu temperamento e algo de feminino em sua disposição que se mostrava de muitas maneiras. Estando na Austrália, o autor teve oportunidade de ler uma correspondência datada de 1856, entre Home e o filho mais velho dos Rymer. Tinham viajado juntos pela Itália e Home tinha abandonado o amigo em circunstâncias que demonstravam inconstância e ingratidão. Mas é justo dizer que sua saúde era então tão precária que dificilmente poderíamos considerá-lo normal. “Tinha ele os defeitos de um caráter emotivo”, disse Lord Dunraven, “como a vaidade altamente desenvolvida, talvez sabiamente lhe permitindo subtrair-se ao ridículo que então era despejado sobre o Espiritismo e tudo quanto a este se ligava. Era sujeito a grandes depressões e crises nervosas dificilmente compreensíveis, mas era, também, simples, bondoso, de bom humor, de disposição amorável, que me atraía... Minha amizade ficou inalterável e sem diminuição até o fim.”
Há poucos daqueles variados dons, que chamamos “mediúnicos” e que São Paulo chama “do Espírito”, que Home não possuísse. Na verdade, a característica de sua força psíquica era uma invulgar versatilidade. Geralmente falamos de um médium de Voz Direta, de um que fala em transe, de um clarividente ou de um de efeitos físicos, quando Home era os quatro.
Tanto quanto podemos verificar, tinha ele pouca experiência quanto à força de outros médiuns e não estava isento daquele ciúme psíquico, que é um traço comum desses sensitivos. Mrs. Jencken, antes Miss Kate Fox, foi o único médium a quem teve amizade.
Sentia amargamente qualquer mistificação, e denotou sempre esse excelente fraco do caráter, qual o de guardar suspeitas de todas as formas de manifestações que não correspondessem exatamente às suas. Essa opinião, expressa de modo não comprometedor em seu último livro “Lights and Shadows of Spiritualism” naturalmente magoaram outros médiuns, que pretendiam ser tão honestos quanto ele. Um mais largo e profundo contacto com os fenômenos o teriam tornado mais caridoso. Assim, ele protestou fortemente contra toda sessão feita no escuro, o que é um conselho de perfeição, de vez que as experiências sobre o ectoplasma, que é a base física de todas as materializações, mostram, em geral, que aquele é afetado pela luz, exceto pela vermelha. Home não tinha grande experiência das materializações completas, tais como foram obtidas naqueles dias por Miss Florence Cook ou por Madame d’Esperance, ou em nossos dias pela mediunidade de Madame Bisson. Assim, podia ele dispensar a obscuridade completa em seu trabalho. Por isso sua opinião foi injusta para com os outros. Por outro lado, Home declarou enfaticamente que a matéria não podia passar através da matéria, porque os seus fenômenos não tomavam esse aspecto. Ainda a prova de que, em certos casos, a matéria podia passar através da matéria era esmagadora. Até pássaros de variedades raras foram trazidos para as salas de sessões, em circunstâncias que excluem qualquer fraude e as experiências de madeira que atravessa a madeira, como as que foram apresentadas a Zöllner e outros professores em Leipzig, foram tão concludentes que se acham relatadas pelo famoso físico na Física Transcendental, de suas experiências com Slade. Deste modo, deve-se levar como uma pequena fraqueza do caráter de Home o fato de gritar e duvidar das forças que porventura ele não possuísse.
Podem alguns acusá-lo de dirigir sua mensagem antes aos dirigentes da sociedade do que às massas trabalhadoras. É provável que, de fato, Home tivesse a fraqueza, assim como as graças de sua natureza artística, que o faziam sentir-se mais feliz numa atmosfera de elegância e de finura e uma repulsa visceral por tudo quanto fosse sórdido e desfavorecido.
Se outras razões não existissem, o precário estado de saúde o tornava inapto para qualquer tarefa pesada; as contínuas hemorragias o levaram a preferir a agradável e refinada vida na Itália, na Suíça e na Riviera. Mas, em relação ao desenvolvimento de sua missão, de lado o auto-sacrifício pessoal, não há a menor dúvida de que a sua mensagem, levada ao laboratório de um Crookes ou à Corte de um Napoleão, foi mais útil do que se tivesse sido levada à multidão. A aprovação da ciência e do caráter era necessária antes que o público ficasse seguro de que essas coisas eram verdadeiras. Se isso não foi inteiramente conseguido a falta cabe certamente aos encapuçados homens de ciência e aos pensadores da época e de modo algum Home, que representou o seu papel de demonstrador com perfeição, deixando a outros homens menos dotados a análise e a publicidade do que lhes havia mostrado. Não era ele um homem de ciência, mas a matéria-prima da ciência, desejando ansioso que os outros dele pudessem aprender tudo quanto pudesse trazer ao mundo, de modo que a própria ciência pudesse dar testemunho da religião, enquanto se apoiasse sobre a ciência. Quando a mensagem de Home tiver sido aprendida completamente, um homem sem fé não será acusado de impiedade, mas de ignorância.
Havia algo de patético no esforço de Home para descobrir alguma crença na qual pudesse satisfazer o seu próprio instinto gregário – porque ele não era tido como um individualista cabeçudo – e ao mesmo tempo achar um nicho no qual pudesse depositar seu próprio volume de autênticas verdades. Sua peregrinação reivindica a afirmação de alguns espíritas de que um homem pode pertencer a qualquer crença e possuir conhecimentos espíritas, mas também apóia os que replicam que a perfeita harmonia com aqueles conhecimentos espíritas só pode ser encontrada, tal qual a coisa se encontra agora, numa comunidade espírita especial. Ah! se pudesse ser assim, pois é ele demasiado grande para afogar-se numa seita, por maior que seja ela. Na mocidade Home seguiu a Wesley, mas logo se passou para a mais liberal atmosfera do Congregacionalismo. Na Itália a atmosfera artística da Igreja Católica Romana e, possivelmente o registro de tantos fenômenos semelhantes aos seus próprios, levaram-no a se converter com a intenção de entrar para uma ordem monástica – intenção que o seu bom senso o levou a abandonar. A sua mudança de religião se deu num período em que as forças psíquicas o haviam abandonado durante um ano e seu confessor lhe garantiu que elas eram de origem perversa e que jamais lhe voltariam, agora que se transformara num filho da verdadeira Igreja. Não obstante, no próprio dia em que se completava um ano, elas voltaram com renovado vigor. Desde então parece que Home foi católico apenas de nome, se é que o foi, e depois de seu segundo casamento – ambos com senhoras russas – foi ele fortemente atraído para a Igreja Grega e foi no seu ritual que o seu corpo foi encomendado em St. Germain, em 1886. “A outro o discernimento dos Espíritos” (1 Epístola aos Coríntios, capítulo 12º versículo 10) é a curta inscrição sobre aquele túmulo, do qual o mundo ainda não ouviu a última palavra.
Se fossem necessárias provas da vida inatacável de Home, estas não poderiam ser melhor apresentadas do que pelo fato de que seus numerosos inimigos, sempre à espera de uma oportunidade para o ataque, jamais puderam encontrar algo em toda a sua carreira para um comentário, a não ser o caso absolutamente inocente, e que se tornou conhecido como o caso Home-Lyon. Qualquer juiz imparcial, lendo os depoimentos nesse caso, – e estes se encontram verbum ad verbum na segunda série dos “Incidents in My Life” – conviria que não há censura mas comiseração devida a Home. Não se poderia desejar maior nobreza de caráter do que a sua em relação àquela mulher desagradável e caprichosa, que inicialmente lhe havia doado boa soma de dinheiro e depois, mudando de idéia, ao ver frustrada a esperança de ser apresentada na alta sociedade, nada levou em consideração com intuito de reaver aquele dinheiro. Se ela apenas tivesse pedido a sua devolução, não há dúvida de que os delicados sentimentos de Home o teriam levado a devolvê-lo, ainda que lhe tivesse custado muito trabalho e despesas, pois se tratava de mudar o seu nome para Home-Lyon, a fim de satisfazer a vontade daquela mulher que queria adotá-lo como filho. Suas exigências, entretanto, eram tais, que ele não as poderia aceitar honrosamente, pois implicava o reconhecimento de que procedera mal aceitando o presente. Consultando as cartas originais – o que, parece, não foi feito pelos poucos que comentaram o caso – verifica-se que Home, o seu procurador S. C. Hall e seu advogado Mr. Wilkinson imploraram àquela senhora que moderasse a sua desarrazoada benevolência que se havia transformado tão rapidamente numa malevolência ainda mais desarrazoada. Ela estava absolutamente determinada a que Home ficasse com o dinheiro e se constituísse seu herdeiro. Jamais houve um homem menos mercenário: ele lhe pediu repetidamente que pensasse em seus parentes, ao que ela respondia que o dinheiro lhe pertencia e que ela poderia fazer com ele o que bem quisesse e que nenhum parente dependia dela. Desde o momento em que aceitou a situação, agiu e escreveu como um filho devotado e não é falta de caridade supor que essa atitude inteiramente filial não tivesse sido aquela que a velhota havia planejado. De qualquer modo, cedo ela se cansou de esperar e exigiu o dinheiro sob a escusa – escusa monstruosa para quem quer que leia as cartas e considere as datas – de que mensagens espíritas é que a tinham levado a tomar aquela resolução.
O caso correu na Corte de Chancery e o juiz aludiu a “inúmeras falsidades de Mrs. Lyon, em tão importantes detalhes –falsidades declaradas sob juramento e tão perversas que causavam um grande embaraço à Corte e desacreditavam o testemunho da queixosa”. A despeito desse comentário cáustico e da elementar justiça, o veredicto foi contra Home, por isso que, de um modo geral, é taxada como falha de provas a defesa em tais casos e uma completa falta de provas é impossível quando a ação é contestada. Sem dúvida Lord Giffard se teria mostrado superior à simples letra da lei, se não fosse tão profundamente contrário a qualquer referência às forças psíquicas, que, no seu modo de ver, eram manifestamente absurdas e ainda eram sustentadas pela defesa em sua cara, na sua própria Corte de Chancery. Até os piores inimigos de Home foram forçados a admitir que o fato de haver ele retido o dinheiro na Inglaterra, em vez de o depositar em lugar onde não pudesse ser requisitado, prova as suas intenções honestas no mais infortunado episódio de sua vida. Não há notícia de que tenha ele perdido a amizade de um só dos homens de honra, que o tinham como amigos, por causa das maquinações de Mrs. Lyon. Os próprios motivos dessa senhora eram óbvios. Como todos os documentos estavam em ordem, seu único caminho para recuperar o dinheiro foi acusar Home de extorsão por meio de simulação; e ela era bastante esperta para saber que chance teria um médium – mesmo um médium amador e que não se fazia pagar – na ignorante e material atmosfera de uma corte de justiça do período médio-vitoriano. Ah! omitamos esse médio-vitoriano e a verificação é a mesma.
As faculdades de Home foram atestadas por tantos e tão famosos observadores e foram mostradas sob condições tão francas que nenhum homem razoável poderá pô-las em dúvida.
Só a prova de Crookes é conclusiva.
Há também, o notável livro, recentemente reeditado, no qual Lord Dunraven conta a história de sua mocidade em ligação com Home.
Mas, de lado estes, entre aqueles que na Inglaterra investigaram nos primeiros anos e cujo testemunho público ou cartas a Home mostram que não só estavam convencidos dos fenômenos, mas também de sua origem espiritual, devemos mencionar a Duquesa de Sutherland, Lady Shelley, Lady Gomm, o Doutor Robert Chambers, Lady Otway, Miss Catherine Sinclair, Mrs. Milner Gibson, Mr. e Mrs. William Howitt, Mrs. De Burgh, o Doutor Gully (of Malvern), Sir Charles Micholson, Lady Dunsany, Sir Daniel Cooper, Mrs. Adelaide Senior, Mr. e Mrs. 5. C. Hall, Mrs. MacDougall Gregory, Mr. Pickersgill, R. A., Mr. E. L. Blanchard e Mr. Robert Bell.
Outros que chegaram a admitir que a teoria da impostura era insuficiente para explicar os fenômenos foram: Mr. Ruskin, Mr. Thackeray (então redator do Cornhill Magazine), Mr. John Bright, Lord Dufferin, Sir Edwin Arnold, Mr. Heaphy, Mr. Durham (escultor), Mr. Nassau Senior, Lord Lyndhurst, Mr. J. Hutchinson (ex-secretário da Bolsa) e o Doutor Lockhart Robertson.
Tais foram as testemunhas e tal o seu trabalho. E ainda quando a sua vida utilíssima e altruísta chegava a seu fim, deve ser lembrado, para eterna vergonha da Imprensa Britânica, que dificilmente se encontra um jornal que não se referisse a ele como um impostor e um charlatão. Contudo chega o momento em que ele será reconhecido pelo que realmente foi – um dos pioneiros do lento e árduo avanço da Humanidade na selva da ignorância, que tanto a retardou.

domingo, 24 de maio de 2009

Cap. 8 - Progressos contínuos na Inglaterra

O relato feito por Mrs. De Morgan sobre dez anos de experiência de Espiritismo cobre um período de 1853 a 1863. O aparecimento desse livro, com o prestigioso prefácio do Professor De Morgan, foi um dos primeiros sinais de que o novo movimento tanto se espalhava nas altas camadas quanto nas massas. Então surgiu o trabalho de D. D. Home e o dos Davenport, que são tratados alhures minuciosamente. O exame pela Sociedade Dialética começou em 1869 e a ele nos referimos mais adiante. O ano de 1870 foi a data das primeiras pesquisas de William Crookes, empreendidas depois do escândalo produzido pela recusa dos homens de ciência “de investigar a existência e a natureza de fatos constatados por muitas testemunhas honestas e fidedignas.”
No mesmo periódico – o Quarterly Journal of Science – refere-se ele à crença compartilhada por milhões, e acrescenta: “Quero verificar as leis que regem a manifestação de tão notáveis fenômenos que, presentemente, ocorrem numa amplitude quase incrível.”
A história dessa pesquisa foi publicada in extenso em 1874 e causou tamanho tumulto entre os mais fossilizados homens de ciência – desses de quem se pode dizer que ficaram com a mente dominada por aquilo em que trabalham – que chegaram a propalar que ele seria expulso da Sociedade Real. A tempestade desabou, mas Crookes foi chocado por sua violência e verificou-se que, durante muitos anos, até que a sua posição fosse consolidada, tornou-se muito cauteloso em exprimir publicamente as suas opiniões. Em 1872-73 apareceu o Reverendo Stainton Moses como um novo fator e sua escrita automática levantou o assunto para um plano mais espiritual, na opinião de muita gente. O lado fenomênico pode atrair a curiosidade, mas quando muito repetido como que choca as mentes judiciosas.
Então ficaram em moda as conferências e os transes. Mrs. Emma Hardinge Britten, Mrs. Cora L. V. Tasan e Mr. J. J. Morse fizeram orações eloquentes, supostamente sob a ação de Espíritos, influenciando largamente enormes auditórios. Mr. Gerald Massey, o conhecido poeta e escritor e o Doutor George Sexton também fizeram conferências públicas. De um modo geral o Espiritismo teve grande publicidade.
O estabelecimento da British National Association of Spiritualists em 1873 deu impulso ao movimento, porque muitos homens públicos bem conhecidos e senhoras da alta sociedade a ela se associaram. Entre estas devem ser mencionadas a Condessa de Caithness, Mrs. McDougall Gregory (viúva do Professor Gregory, de Edimburgo), o Doutor Stanhope Speer, o Doutor Gully, Sir Charles Isham, o Doutor Maurice Davies, Mr. H. D. Jencken, o Doutor George Sexton, Mrs. Ross Church (Florence Marryat), Mr. Newton Crosland e Mr. Benjamin Coleman.
A mediunidade de uma alta qualidade, no setor dos fenômenos físicos, foi fornecida por Mrs. Jencken (Kate Fox) e Miss Florence Cook. O Doutor J. R. Newton, famoso médium curador da América, chegou em 1870, e numerosas curas gratuitas foram registradas. Desde 1870 Mrs. Everitt exercitou uma mediunidade maravilhosa, como a de D. D. Home, gratuitamente, convencendo a muita gente. Herne e Williams, Mrs. Grusy, Eglington, Slade, Lottie Fowler e outros fizeram muitas conversões através de sua mediunidade. Em 1872 as fotografias do Espírito de Hudson despertaram enorme interesse e em 1875 o Doutor Alfred Russel Wallace publicou o seu famoso livro “On Miracles and Modern Spiritualism”.
Um bom meio de traçar o desenvolvimento do Espiritismo nesse período é examinar o depoimento de testemunhas fidedignas contemporâneas, especialmente as que são qualificadas por sua posição e experiência para poderem opinar. Antes, porém, de lançar um olhar sobre o período que estamos considerando, olhemos a situação em 1866, tal qual a via Mr. William Howitt nuns poucos parágrafos tão admiráveis que o autor se sente obrigado a citá-los ad litteram. Diz ele:
“A posição atual do Espiritismo na Inglaterra, se a imprensa fosse onipotente, dada a sua influência, seria pouco animadora. Depois de empregar todos os meios possíveis para prejudicar e desacreditar o Espiritismo; depois de lhe haver aberto as suas colunas, na esperança de que o vazio e a loucura ficassem tão aparentes que os seus espertos inimigos logo fossem capazes de atingi-lo com argumentos irrespondíveis e assim verificarem que todas as vantagens da razão de fato estavam de seu lado; depois de havê-lo difamado e ferido sem propósito, toda a imprensa, como se por consenso geral ou de plano pré-estabelecido, adotou a tática de abrir as suas colunas a toda falsidade e a toda história insensata a respeito dele, mas se fechando hermeticamente a qualquer explicação, refutação ou defesa. Desde que todos os outros meios para o liquidar haviam falhado, foi decidido sufocá-lo. Pregar um esparadrapo literário em sua boca e deixar que seu pescoço fosse cortado por quem quer que desejasse fazê-lo. Assim esperava poder desferir-lhe o golpe de graça.
“Se alguma coisa pudesse aniquilar o Espiritismo, sua atual estima pelo público inglês, seu tratamento pela imprensa e pelas cortes de justiça, a tentativa de sua supressão por todas as forças da inteligência pública, o ódio que lhe votam todos os heróis do púlpito de todas as igrejas e credos, a sua simples aceitação ainda mesmo por esse público que a imprensa considera maluco e pervertido, as suas próprias divisões internas – numa palavra, a sua preeminente impopularidade o teriam liquidado. Mas é assim? Ao contrário: jamais ele se arraigou tão firmemente na massa de mentes adiantadas; nunca seu número cresceu tão rapidamente; jamais suas verdades foram mais eloquente e claramente defendidas; jamais as investigações a seu respeito foram mais abundantes e ansiosas.
“Durante todo o tempo em que a imprensa e os boatos estiveram lançando o insulto e o desprezo sobre ele, jamais as reuniões de Harley Street foram tão concorridas e superlotadas por senhoras e cavalheiros das classes médias e altas, que ouviam com admiração as eloquentes e sempre variadas mensagens de Emma Hardinge. Ao mesmo tempo os Davenport, milhares de vezes denunciados como impostores, outras tantas demonstraram que os fenômenos que produziam continuavam inexplicáveis por qualquer teoria, exceto a espírita.
“Que significa tudo isto? Que indicam esses fatos? Que a imprensa e o púlpito, os magistrados e as cortes de justiça uniram as suas forças, mas fracassaram. Ficaram aniquilados ante essa coisa que eles próprios classificam de pobre, maluca, falsa e inconsistente. Se ela fosse tão pobre, maluca, falsa e inconsistente, como é que o seu saber, as suas denúncias inescrupulosas, os seus vastos meios de ataque e os seus não menores meios de cerceamento da defesa, as suas ordens aos ouvintes e sua opinião para a multidão – como é que todo o seu espírito, sarcasmo, lógica e eloquência não a podem atingir?
“Longe de a abalar e atingir, não alcança um cabelo de sua cabeça ou uma franja de seu vestido.
“Já não é tempo para que todas essas hostes combinadas dos grandes e dos sábios, dos cientistas e dos ilustrados, dos dirigentes do senado e das cortes de justiça, os eloquentes favoritos do Parlamento, os magnatas da imprensa popular, de posse de toda essa artilharia intelectual que um grande sistema nacional de educação e um grande sistema nacional de Igreja, de Estado e de aristocracia, acostumado a proclamar aquilo que deve ser aceito como verdade e considerado honroso por todos os cavalheiros e senhoras honradas – já não é tempo, perguntava eu, de que todo esse grande e esplêndido mundo de espírito e de sabedoria comece a suspeitar de que defrontam algo de sólido? De que existe algo vital nisso que tem tratado como um fantasma?
“Não quero dizer a essas grandes corporações que governam o mundo que abram os olhos e vejam que os seus esforços são infrutíferos e confessem a sua derrota, porque provavelmente elas jamais abrirão os olhos e confessarão a sua vergonha. Mas digo aos próprios espíritas: por mais escuros que os dias vos pareçam, jamais foram tão cheios de promessas. Ligadas como estão todas as forças dos instrutores e dirigentes públicos, jamais, entretanto, as perspectivas foram mais claras de nossa vitória final. Sobre ele há todas as características de conquista de influência em nossos dias. Ele tem à sua frente todo o legitimismo da história. Todas as grandes reformas sociais, morais, intelectuais ou religiosas triunfaram através da luta”.
Como que mostrando a mudança ocorrida depois do que Mr. Howitt escreveu em 1866, encontramos em The Times de 26 de dezembro de 1872 um artigo sob o título de “Espiritismo e Ciência”, estirando-se por três colunas e meia, no qual se exprime a opinião de que agora “é chegado o momento de mãos competentes cortarem o nó górdio”, muito embora não explique porque as mãos de Crookes, de Wallace ou de De Morgan seriam incompetentes.
Falando sobre o livrinho de Lord Adare, de edição particular, a respeito de suas experiências com D. D. Home, o escritor parece impressionado pela posição social das várias testemunhas. As características desse artigo são a grosseria e o pedantismo:
“Um volume que se acha à nossa frente mostra quanto essa loucura espalhou-se por toda a sociedade. Foi-nos emprestado por um distinto espiritista, sob o solene compromisso de que não publicaríamos nenhum dos nomes ali referidos. Contém cerca de 150 páginas de relatos de sessões e foi impresso em particular por um nobre Conde, recentemente desaparecido da Câmara dos Lords; e que também desocupou, ao que nos parece, as cadeiras ocupadas por Espíritos e as mesas de que gostava em vida, não sabiamente, posto gostasse muito. Nesse livro, coisas mais maravilhosas do que quaisquer outras de que tenhamos notícia, são relatadas minuciosamente, de modo tão natural quanto se fossem fatos rotineiros. Não cansaremos o leitor citando algum dos casos relatados e, não obstante, ele acreditará em nossa palavra quando dissermos que se enquadram em toda sorte de manifestações, de profecias para baixo.
“O que desejamos observar mais especialmente é que à entrada do livro se acha o atestado de cinqüenta respeitáveis testemunhas. Entre estas se acham uma duquesa viúva, e outras senhoras de posição, um Capitão de Guardas, um nobre, um barão, um membro do Parlamento, vários membros de corporações científicas, um advogado, um comerciante e um médico. As camadas mais altas da classe média estão representadas por gente de todos os graus e por pessoas que, a julgar pela posição que ocupam e pela profissão que exercem, deviam possuir inteligência e perspicácia.”
O eminente naturalista Doutor Alfred Russel Wallace, numa carta escrita a The Times, em 4 de janeiro de 1874, descrevendo uma visita a um médium público, diz:
“Não acho exagero dizer que os fatos principais agora se acham tão bem estabelecidos e tão facilmente verificáveis como qualquer dos mais excepcionais fenômenos da Natureza ainda não reduzidos a lei. Eles tem uma significação mais importante na interpretação da História, que está cheia de narrativas de fatos similares, e na natureza da vida e do intelecto, sobre os quais a ciência física derrama uma luz muito fraca e muito incerta; e é minha crença firme e deliberada que cada ramo da filosofia deve sofrer até serem os fatos honesta e seriamente investigados e trabalhados como constituintes de uma parte essencial dos fenômenos da natureza humana”.
A gente se extravia com os fenômenos do ectoplasma e as experiências de laboratório, que desviam o pensamento do essencial. Wallace foi um dos poucos cuja mentalidade grandiosa, avassaladora e sem preconceitos, viu e aceitou a verdade em sua maravilhosa inteireza, desde as humildes provas físicas de uma força exterior até ao mais alto ensino mental que essa força podia trazer, ensino que ultrapassa de muito em beleza e em credibilidade tudo quanto a mente moderna tem conhecido.
A aceitação pública e o decidido apoio desse grande homem de ciência, um dos primeiros cérebros de seu tempo, foram de grande importância, desde que ele teve espírito para compreender a completa revolução religiosa que estava por detrás desses fenômenos.
Foi um fato curioso que, salvo algumas exceções, em nossos dias, assim como no passado, a sabedoria tenha sido dada aos humildes e negada aos doutos. Sentimento e intuição triunfaram onde falhou o cérebro. Talvez pensassem que a questão era simples. Ela deve ser expressa numa série de perguntas, à maneira de Sócrates: “Estabelecemos contacto com a inteligência dos que morreram?” O espírita diz: “Sim” “Deram informações sobre a nova vida que levam e como esta foi afetada por sua vida terrena?” Ainda, “Sim”. “Acharam que corresponde à descrição feita por todas as religiões da Terra?” “Não.” Mas se é assim, não está claro que a nova informação é de vital importância religiosa? O humilde espiritista vê isto e adapta a sua religiosidade aos fatos.
Sir William Barrett, então professor, apresentou o problema do Espiritismo à Associação Britânica para o Progresso da Ciência em 1876. Seu estudo tinha por título “Sobre alguns fenômenos associados com condições mentais anormais.” Foi difícil ser ouvido. A Comissão de Biologia recusou o estudo e passou-o para a Subcomissão de Antropologia, que só o aceitou pelo voto de Minerva do Secretário, Doutor Alfred Russel Wallace. O Coronel Lane Fox ajudou a vencer a oposição, perguntando por que, se no ano anterior havia sido discutida a magia antiga, este ano não se podia discutir a magia moderna. A primeira parte do trabalho do Professor Barrett tratava de mesmerismo, mas na segunda parte eram descritas as suas experiências com os fenômenos espíritas. E insistia para que novo exame científico fosse feito sobre a matéria. Deu um detalhe convincente de uma experiência sobre batidas, feita com uma criança.
Na discussão que se seguiu, Sir William Crookes falou das levitações que ele havia testemunhado com D. D. Home; disse da levitação: “A prova em seu favor é mais forte do que a prova em favor de quase todos os fenômenos que a Associação Britânica pode investigar”. Fez ainda as seguintes observações relativas ao seu próprio método de pesquisa psíquica:
“Pediram-me para investigar logo que apareceu o Doutor Slade e eu expus as minhas condições. Jamais fiz investigações senão nessas condições. Deveriam ser feitas em minha casa; eu mesmo deveria escolher os amigos e os assistentes; seriam realizadas dentro de minhas próprias condições e eu faria o que quisesse em relação aos aparelhos. Sempre que foi possível, procurei fazer que os testes fossem realizados pelos próprios aparelhos de física e nunca acreditei mais do que era possível em meus próprios sentidos. Mas quando é necessário crer em meus sentidos, sou obrigado a discordar de Mr. Barrett quando diz que um investigador físico não auxilia um médium profissional. Sustento que um investigador físico é mais que um auxiliar.”
Uma importante contribuição para a discussão foi a de Lord Rayleigh, o distinto matemático, que disse:
“Penso que somos muito obrigados ao Professor Barrett, por sua coragem, pois é necessária alguma coragem para avançar neste terreno e trazer-nos os benefícios de sua cuidadosa experiência. Meu próprio interesse pelo assunto data de dois anos. Fui atraído inicialmente para ele pela leitura das investigações de Mr. Crookes. Conquanto as minhas oportunidades não tenham sido tão felizes como as do Professor Barrett, tenho visto o bastante para me convencer de que estão errados os que quiserem obstar as investigações atirando o ridículo sobre os que se sentem inclinados a fazê-las.”
O orador seguinte foi Mr. Groom Napier, acolhido com gargalhadas, quando descreveu as constatações psicométricas feitas de algumas pessoas apenas por sua caligrafia encerrada em envelopes lacrados; e quando começou a descrever as luzes de Espíritos, que de próprio tinha visto, o barulho foi tal que se viu obrigado a sentar-se. Respondendo à crítica, disse o Professor Barrett:
“Isto mostra o enorme avanço que o assunto fez nestes poucos anos: que uma comunicação sobre fenômenos espíritas, que há poucos anos causaria riso, agora é admitida na Associação Britânica e merece uma larga discussão, como a de hoje.”
O Spectator, de Londres, num artigo intitulado “A Associação Britânica e a Comunicação do Professor Barrett” começa com este ponto de vista de uma mente larga.
“Agora que temos à nossa frente uma descrição completa da comunicação do Professor Barrett, e da discussão da mesma, seja-nos permitido exprimir a nossa esperança de que a Associação Britânica realmente exerça alguma influência sobre o assunto da comunicação, a despeito dos protestos do partido que chamaríamos partido da incredulidade supersticiosa. Dizemos incredulidade supersticiosa porque é realmente pura superstição, e nada mais para admitir que estejamos tão bem informados sobre as leis da Natureza que, mesmo os fatos cuidadosamente examinados e atestados por um observador experimentado devam ser postos de lado como absolutamente indignos de crédito, simplesmente porque, à primeira vista, se chocam com aquilo que já é mais conhecido.”
Os pontos de vista de Sir William Barrett foram progredindo firmemente até que aceitou a posição de espírita em termos inequívocos, antes de sua lamentada morte em 1925. Viveu até o mundo melhorar o seu antagonismo contra tais assuntos, embora pequena fosse a diferença observada na Associação Britânica, que pareceu obscurantista como sempre. Essa tendência, entretanto, não deve ter sido um mal porque, como assinala Sir Oliver Lodge, se os prementes problemas materiais se tivessem complicado com as soluções psíquicas, é possível que não tivessem sido resolvidos. Deve ser digno de registro que Sir William Barrett, em conversa com o autor, tenha lembrado que os quatro homens que o apoiaram naquele difícil momento histórico, viveram bastante para receberem a Ordem do Mérito – a maior distinção que o seu país podia conceder. Os quatro foram Lord Rayleigh, Crookes, Wallace e Higgins.
Não era de esperar que o rápido crescimento do Espiritismo fosse isento de aspectos menos desejáveis. Estes foram, pelo menos, dois. Primeiro, o grito de mediunidade fraudulenta, ouvido com frequência. À luz de nossos últimos e mais completos conhecimentos sabemos que muito daquilo que reveste as aparências de fraude absolutamente não o é. Ao mesmo tempo, a ilimitada credulidade de uma parte dos Espiritistas indubitavelmente ofereceu um campo fácil aos charlatães. Numa conferência lida na Sociedade da Universidade de Cambridge para Investigações Psicológicas, em 1879, disse o seu presidente Mr. J. A. Campbell.
“Desde o aparecimento de Mr. Home, o número de médiuns aumenta dia a dia, como aumenta a loucura e a impostura. Aos olhos dos tolos cada farsante se converteu numa figura angélica; e não só cada farsante, mas cada trapaceiro, metido numa mortalha, é chamado ou quer se chamar um “Espírito materializado”. Uma suposta religião foi assim estabelecida e nela a honra dos mais sagrados nomes foi transferida para Espíritos de batedores de carteiras. Não farei aos leitores o insulto de falar do caráter dessas divindades, nem das doutrinas que as mesmas ensinam. Assim é sempre quando a loucura e a ignorância tomam em suas mãos a arma da realidade eterna para abusos, distorções e até crimes. É o mesmo que crianças a brincarem com ferramentas afiadas; e quem, senão um ignorante, iria gritar: faca malvada! Pouco a pouco o movimento se vai libertando dessas excrescências; gradativamente se vai tornando mais moderado, mais puro e mais forte; e como homens sensíveis e educados, estudam, oram e trabalham, empenhando-se em fazer bom uso de seus conhecimentos, nesse sentido o movimento crescerá.”
O segundo aspecto foi o aparente crescimento daquilo que pode denominar-se Espiritismo anticristão, embora não anti-religioso. Isto levou William Howitt e outros destacados mantenedores do movimento a se afastarem deste. Howitt e outros escreveram fortes artigos contra essa tendência no Spiritual Magazine.
Uma sugestão, quanto à necessidade de cautelas e equilíbrio apareceu nas observações de Mr. William Stainton Moses que, numa comunicação lida perante a Associação Nacional Britânica dos Espiritistas, a 26 de janeiro de 1880 diz:
“Precisamos muitíssimo de disciplina e de educação. Ainda não tomamos pé após o nosso rápido crescimento. Nascida há trinta anos, a criança cresceu em estatura, mas não em sabedoria, e muito rapidamente. Cresceu tão rapidamente que a sua educação foi descurada. Na expressiva linguagem de sua pátria, foi ‘arrancada’ promiscuamente. E o seu crescimento fenomenal absorveu todas as outras considerações. É chegado o momento em que aqueles que o consideraram como um aleijão produzido pela Natureza apenas para morrer prematuramente, começam a ver que se enganaram. A monstruosa criação quer viver; e, por baixo de sua feiúra, o menos simpático olhar percebe um objetivo coerente em sua existência. É a apresentação de um princípio inerente à natureza do homem, um princípio que a sua sabedoria desenvolveu até que fosse eliminado inteiramente, mas que brota sempre e sempre, malgrado seu – o princípio do Espírito como oposto à Matéria, da Alma agindo e existindo independentemente do corpo que a encerra. Longos anos de negação de alguma coisa, salvo as propriedades da matéria, levaram as grandes luzes da ciência moderna ao puro Materialismo. Assim, para eles, o Espiritismo é um portento e um problema. É uma volta à superstição; uma sobrevivência de selvageria; um borrão na inteligência do século dezenove. Ridicularizado, ele ridiculariza; desdenhado, paga-se na mesma moeda.”
Em 1881 apareceu Light, um semanário espírita de alta classe, e em 1882 assistimos à criação da Society for Psychical Research.
De um modo geral pode-se dizer que a atitude da ciência organizada, durante esses trinta anos, foi tão irracional e anticientífica quanto a dos Cardeais para com Galileu e que, se tivesse havido uma Inquisição Científica, esta teria lançado o terror sobre o novo conhecimento. Nenhuma tentativa séria, de qualquer espécie, até a formação da Society for Psychical Research foi feita no sentido de compreender e explicar um assunto que estava atraindo a atenção de milhões de criaturas. Em 1853 Faraday lançou a teoria de que o movimento das mesas era produzido por uma pressão muscular, que pode realmente ser verdadeira nalguns casos, mas nenhuma relação tem com a levitação de mesas e, em todo o caso, só se aplica a uma classe de fenômenos psíquicos. A costumeira “objeção” científica era que nada ocorria, mas isto desprezava o testemunho de milhares de pessoas fidedignas. Outros sustentavam que aquilo que se passava era susceptível de ser repetido por um feiticeiro, e qualquer imitação grosseira, como a paródia dos Davenport, feita por Maskelyne, era calorosamente saudada como uma mistificação, sem referência ao fato de que todo o aspecto mental da questão, com a sua prova esmagadora, ficava inatingido.
A gente “religiosa” ficava irritada por se ver sacudida nas suas práticas tradicionais e, como selvagem, se dispunha a admitir que tudo aquilo era obra do diabo. Assim Católicos Romanos e seitas Evangélicas se encontraram unidos na sua oposição. É fora de dúvida que podemos chamar Espíritos baixos, desde que em redor de nós existem Espíritos de todas as classes e que o semelhante atrai o semelhante. Mas os ensinamentos elevados, consistentes e filosóficos que são dados aos investigadores sérios e de mentalidade honesta mostram que não é o diabolismo, mas o Angelismo que está dentro do nosso alcance. O Doutor Carpenter sustentou uma teoria complexa, mas parece que ficou só na sua aceitação e mesmo na sua compreensão. Os cientistas tiveram uma explicação: era o estado das juntas, o que é ridículo para quem quer que tenha tido experiência pessoal daqueles sons percutidos, que variam desde o tic-tac de um relógio até a pancada de um martelete.
Outras explicações, vez por outra, incluíam a doutrina teosófica, que admitia os fatos mas desprezava os Espíritos, descrevendo-os como cascões astrais, com uma espécie de semiconsciência sonhadora, ou possivelmente uma consciência atenuada, que os reduzia a criaturas sub-humanas pela inteligência e pela moralidade. Certamente a qualidade das manifestações espíritas varia enormemente, mas o mais alto se acha tão elevado que dificilmente podemos imaginar que apenas nos achamos em contacto com uma fração do ser pensante. Entretanto, como é certo que, mesmo neste mundo, nosso ser subliminal é muitíssimo superior à nossa individualidade normal, é muito natural que o mundo dos Espíritos deve confrontar-nos com algo inferior aos seus mais altos poderes.
Uma outra teoria sustenta a Anima Mundi, vasto reservatório ou banco central da inteligência, com uma câmara de compensação, na qual todas as consultas são atendidas. Os rigorosos pormenores que recebemos do Outro Lado são incompatíveis com qualquer idéia, tão vaga quão grandiosa, do destino. Finalmente, há uma alternativa realmente formidável, que o homem tem um corpo etérico com muitos dons desconhecidos, entre os quais deve ser incluído um poder de manifestação exterior em formas curiosas. É a esta teoria da Criptestesia que Richet e outros se agarraram e até um certo ponto há um argumento em seu favor. O autor se convenceu de que há uma etapa preliminar e elementar em todo trabalho psíquico que depende de um poder inato e possivelmente inconsciente do médium. A leitura em invólucro fechado, a produção de batidas a pedido, a descrição de cenas distantes, os notáveis efeitos da psicometria, as primeiras vibrações da Voz Direta – cada um e todos em diversas ocasiões parecem emanações do próprio médium. Assim, em muitos casos deveria aparecer uma inteligência exterior capaz de se apropriar daquela força e utilizá-la para seus próprios objetivos. Temos uma ilustração nas experiências de Bisson e de Schrenk Notzing com Eva, nas quais as formas ectoplásmicas a princípio eram sem dúvida reflexo de ilustrações dos jornais, de certo modo modeladas pela passagem através da mente do médium. Mais tarde veio um período mais profundo, no qual a forma ectoplásmica evoluiu a ponto de se mover e falar. O grande cérebro de Richet e o seu enorme poder de observação se concentraram muito sobre os fenômenos físicos e parece que não teve muito contacto com as experiências pessoais mentais e espirituais que possivelmente lhe teriam modificado os pontos de vista. Cabe, entretanto, acrescentar que tais pontos de vista se desenvolveram continuamente na direção da explicação espírita.
Resta apenas a hipótese da personalidade complexa, que bem pode influenciar certos casos, posto pareça ao autor que tais casos também possam ser explicados pela obsessão. Entretanto esses exemplos apenas tocam a superfície do assunto e ignoram completamente o aspecto fenomênico, de modo que o assunto não deve ser levado muito a sério. Contudo nunca será por demais repetido que o investigador deveria esgotar cada explicação normal possível para sua completa satisfação, antes de adotar o ponto de vista espírita. Se assim tiver procedido, sua plataforma será estável; se assim não tiver feito, jamais estará seguro de sua estabilidade. Na verdade pode o autor dizer que, ano após ano, agarrou-se a cada linha de defesa até que, finalmente, foi compelido, desde que tinha de guardar a honestidade mental, a abandonar a posição materialista.

Cap. 7 - A Aurora na Inglaterra

Os primeiros espíritas frequentemente tem sido comparados aos primeiros cristãos e, na verdade, há muitos pontos de semelhança. Num ponto, entretanto, os espíritas levam uma vantagem. As mulheres da antiga dispensação representaram nobremente o seu papel, vivendo como santas e morrendo como mártires; mas não aparecem como pregadoras e missionárias. A força psíquica e o conhecimento espírita, entretanto, são tão grandes num sexo quanto no outro; daí muitos dos grandes pioneiros da revelação espírita terem sido mulheres. Isto deve ser reclamado especialmente em relação a Emma Hardinge Britten, criatura cujo nome cresce à medida que o tempo passa. Contudo, houve várias outras missionárias destacadas; e a mais importante destas, do ponto de vista inglês, é Mrs. Hayden, a primeira a trazer os novos fenômenos a estas plagas, no ano de 1852. Tínhamos dos velhos apóstolos a fé religiosa. Finalmente aqui estava um apóstolo do fato religioso.
Mrs. Hayden era uma senhora notável tanto quanto excelente médium. Era esposa de um respeitável jornalista da Nova Inglaterra, que a acompanhava em sua missão, organizada por um tal senhor Stone, o qual tinha alguma experiência das faculdades dela na América. Por ocasião de sua visita foi descrita como “moça, inteligente e, ao mesmo tempo, de maneiras simples e cândidas”. Acrescenta o seu crítico britânico:
“Ela desarmava a suspeita por uma atitude de naturalidade sem afetação e muitos que vinham procurar divertir-se à sua custa eram forçados ao respeito e, até, à cordialidade pela paciência e bom humor que ela demonstrava. A invariável impressão deixada por uma entrevista com ela era que, conforme a observação de Mr. Dickens, se os fenômenos produzidos por ela fossem atribuídos a artifícios, era ela, até onde a arte poderia chegar, a mais perfeita artista, jamais apresentada ao público.
A ignorante imprensa britânica tratou Mrs. Hayden como simples aventureira americana. Seu verdadeiro calibre mental, entretanto, pode ser avaliado pelo fato de que, alguns anos mais tarde, depois de seu regresso aos Estados Unidos, Mrs. Hayden formou-se em medicina e exerceu a profissão durante quinze anos. O Doutor James Rodes Buchanan, famoso pioneiro da psicometria, a ela se refere como “um dos mais hábeis e bem sucedidos médicos que jamais conheceu.” Foi-lhe oferecida uma cadeira de professor de medicina numa faculdade americana e ela foi empregada pela Globe Insurance Company, no serviço de proteção da companhia contra os prejuízos nos seguros de vida. Um dos aspectos de seu sucesso era aquilo que Buchanan descreve como o seu gênio psicométrico. E acrescenta um único tributo ao fato de seu nome ter sido quase esquecido pela Junta de Saúde, porque durante muitos anos ela não deu nenhum atestado de óbito.
Tudo isto, entretanto, estava acima do conhecimento dos cépticos de 1852, que não podem ser censurados por insistirem para que essas estranhas manifestações de além-túmulo fossem examinadas com o máximo rigor, antes de serem admitidas. Ninguém poderia opor-se a essa atitude da crítica. Mas o que parece estranho é que uma proposição que, se verdadeira, envolveria tão boas novas quanto a transposição das barreiras da morte e a verdadeira comunicação dos santos, provoque não uma crítica serena, conquanto rigorosa, mas uma tempestade de insultos e de abusos, inescusáveis em qualquer momento, mas principalmente quando dirigidos a uma senhora que visitava os nossos meios. Diz Mrs. Hardinge Britten que Mrs. Hayden não apareceu em cena antes que os chefes da imprensa, do púlpito e das academias não tivessem contra ela levantado uma tempestade de obscenidades, de perseguições e de insultos, tão deprimentes para os autores quanto humilhantes para o decantado liberalismo e para a acuidade científica de sua época. Acrescenta que o seu delicado espírito feminino deve ter sido profundamente ferido e que a harmonia mental, tão essencial à produção de bons resultados psicológicos, constantemente foi destruída, pelo cruel e insultuoso tratamento daqueles que se apresentaram como investigadores, mas na verdade ardendo de desejo de destruí-la e armando ciladas para falsearem as verdades de que Mrs. Hayden se tornara instrumento. Extremamente sensível ao ânimo de seus visitantes, ela podia sentir, e por vezes se abateu sob a esmagadora força do antagonismo despejada sobre ela – sem que, então, soubesse como repelir ou resistir.
Ao mesmo tempo não se achava a nação inteira envolvida nessa hostilidade irracional que, de forma diluída, ainda vemos em torno de nós. Levantaram-se homens corajosos, que não temeram comprometer a sua carreira profissional ou a sua reputação de equilíbrio, como campeões contra uma causa impopular: eram tangidos pelo simples apego à verdade e por aquele espírito cavalheiresco, revoltado contra a perseguição a uma senhora. O Doutor Ashburner, um dos médicos do rei, e Sir Charles Isham eram contados entre os que defenderam o médium pela imprensa.
Julgada pelos modernos padrões, a mediunidade de Mrs. Hayden parece ter sido estritamente limitada. A não ser para as batidas, pouco se fala de fenômenos físicos, do mesmo modo que não se alude a luzes, a materializações, ou Vozes Diretas. Entretanto, em harmoniosa companhia, as respostas obtidas pelas batidas eram exatas e convincentes. Como todo verdadeiro médium, era sensitivo às discórdias em seu redor. E o resultado disso era que a multidão desprezível de zombadores e pesquisadores de maus instintos que a visitavam tinham nela uma vítima fácil. Decepção é paga com a decepção e o louco recebe resposta conforme a sua loucura, embora a inteligência que está por detrás das palavras aparentemente não se preocupe muito com o fato de que o instrumento empregado possa ser tomado como responsável pela resposta. Esses pseudopesquisadores enchem a imprensa com seus relatos humorísticos de como enganaram aos Espíritos quando, na realidade, eles é que foram enganados. George Henry Lewes, posteriormente esposo de George Eliot era um desses cínicos investigadores. Conta ele com ironia que, tendo perguntado por escrito ao Espírito manifestante: “Mrs. Hayden é uma impostora?”, este respondeu:
“Sim”. Lewes era suficientemente desonesto para citar isto como se fosse uma confissão de culpa de Mrs. Hayden. Qualquer um daí deduziria que as batidas eram inteiramente independentes do médium e, ainda, que perguntas feitas com puro espírito de frivolidade não merecem resposta séria.
Entretanto, é pela forma positiva e não pela negativa que perguntas como esta devem ser julgadas; e o autor deve aqui usar citações mais do que normalmente é seu hábito, pois não há outra maneira de mostrar como aquelas sementes foram inicialmente lançadas na Inglaterra e destinadas a atingir tão grandes alturas. Já aludiu ao testemunho do Doutor Ashburner, o famoso médico, e talvez seja bom acrescentar algumas palavras suas. Diz ele:
“O sexo deveria tê-la protegido contra as injúrias, se esses rapazes da imprensa não tem consideração pelos sentimentos de hospitalidade para com alguém de nossa classe, pois Mrs. Hayden é esposa de um antigo editor e proprietário de jornal em Boston, o qual tem a maior circulação na Nova Inglaterra. Eu lhes declaro que Mrs. Hayden não é uma impostora; e quem quer que se aventure a uma conclusão oposta fa-lo-á sacrificando a verdade.”
Novamente, em longa carta a The Reasoner depois de confessar que tinha visitado a médium numa disposição de espírito de absoluta incredulidade, esperando testemunhar “a mesma classe de aparentes absurdos”, que tinha encontrado em outros supostos médiuns, escreve Ashburner: “Em relação a Mrs. Hayden tenho tão forte convicção de sua perfeita honestidade que me admiro de que alguém possa deliberadamente acusá-la de fraude”. Ao mesmo tempo fornece detalhes de comunicações verazes que recebeu.
Entre os investigadores estava o célebre matemático e filósofo Professor De Morgan. Ele relata suas experiências e conclusões no longo e magistral prefácio ao livro de sua esposa “From Matter to Spirit”, publicado em 1863, dizendo:
“Há dez anos passados Mrs. Hayden, a conhecidíssima médium americana, veio sozinha à minha casa. A sessão começou imediatamente após a sua chegada. Oito ou nove pessoas de todos os graus de crença e de descrença de que a coisa fosse impostura se achavam presentes. As batidas começavam como de costume. Para mim eram limpas, claras, fracos sons que, se tivessem durado, dir-se-iam de uma campainha. Então os comparei ao ruído feito pelas pontas de agulhas de tricô, se largadas de uma certa altura sobre o mármore de uma mesa e que instantaneamente fosse abafado por um processo qualquer. E a seguir a prova que fizemos mostrou que minha descrição era razoavelmente aceitável... No último período naquela noite, depois de cerca de três horas de experiência, Mrs. Hayden levantou-se e falando a uma outra mesa, enquanto tomava um refresco, subitamente uma criança disse: “Quererão todos os Espíritos que estiveram aqui esta noite bater ao mesmo tempo?”
Nem bem haviam sido pronunciadas aquelas palavras e uma saraivada de batidas de agulhas de tricô foi ouvida durante cerca de dois segundos, ouvindo-se distintamente o ruído forte das dos homens e mais fraco das mulheres e crianças, embora em perfeita desordem na sua produção”.
Depois de uma observação no sentido de assentar que admite as batidas como produzidas pelos Espíritos, continua o Professor De Morgan:
“Solicitado a fazer uma pergunta ao primeiro Espírito, perguntei se poderia fazer tal pergunta mentalmente, isto é, sem a pronunciar, ou a escrever, ou apontar as letras componentes, e se Mrs. Hayden poderia ficar com os braços estendidos enquanto estivesse sendo dada a resposta. Os pedidos foram imediatamente garantidos por duas batidas. Fiz a pergunta e desejei que a resposta fosse dada numa só palavra que escolhi; tudo mentalmente.
Então, tomei o alfabeto impresso, pus o livro de pé à sua frente e, olhando para aquele, comecei a apontar as letras como de costume. Foi dada a palavra chess; foi dada por meio de batidas a cada letra. Eu tinha agora uma raciocinada certeza da seguinte alternativa: ou uma leitura do pensamento de caráter inteiramente inexplicável, ou uma acuidade sobre-humana da parte de Mrs. Hayden, que lhe permitia perceber a letra que eu fixava, muito embora, sentada a cerca de dois metros do livro que escondia o meu alfabeto, nem pudesse ver a minha mão nem os meus olhos nem, de modo algum, como estava apontando as letras. Antes que a sessão terminasse eu tinha sido obrigado a afastar a segunda hipótese.”
Outro episódio da sessão, que ele relata, é dado com muitos detalhes, numa carta dirigida ao Reverendo W. Heald, dez anos antes que fosse publicada no livro de sua esposa “Memoir of Agostous De Morgan”, páginas 221 e 222:
“Então veio meu pai (ob. 1816) e, depois de uma ligeira conversa, o seguinte diálogo foi estabelecido:
- “Lembra-se de um periódico que tenho em mente?” –“Sim.” – “Lembra-se das expressões que se referem a você?”
– “Sim.” – “Pode dar-me pelas cartas as iniciais daquelas expressões?” – “Sim.”
“Então comecei a apontar o alfabeto, tendo um livro a tapar as cartas. Mrs. H. se achava do outro lado de uma grande mesa redonda e uma lâmpada forte estava entre nós. Apontei letra por letra até que cheguei a F, que supunha fosse a primeira inicial. Nenhuma batida. Alguém perto de mim disse: “Você passou; houve uma batida no começo.” Recomecei e ouvi uma batida distinta no C. Isto me intrigou, mas logo vi o que era. A sentença havia começado por uma batida mais cedo do que eu esperava. Eu tinha deixado passar o “C” e registrado o “D” “T” “E” “O” “C”, iniciais das palavras consecutivas de referência a meu pai, numa velha revista publicada em 1817, das quais ninguém na sala jamais ouvira falar, exceto eu. “C” “D” “T” “E” “O” “C” estava certo e, assim que o constatei, parei, perfeitamente satisfeito que alguma força, ou alguém, ou algum Espírito, estivesse lendo os meus pensamentos. Estas e outras coisas se continuaram por cerca de três horas, durante grande parte das quais Mrs. H. estivera lendo a “Key to Uncle Tom’s Cabin”, que nunca tinha visto antes e lhe asseguro que o fazia com tanta avidez quanto você pode imaginar numa americana que o vê pela primeira vez. Enquanto isto, nós nos distraíamos por outro lado com as batidas. Declaro que tudo isto é absolutamente verdadeiro. Desde então tenho visto isto com frequência em minha casa, sob o testemunho de várias pessoas. A maior parte das respostas é dada pela mesa, na qual são colocadas de leve uma ou duas mãos, para apontar as letras. Há muita coisa confusa nas respostas, mas de vez em quando vem algo que nos surpreende. Não tenho idéia formada a respeito, mas em um ou dois anos pode acontecer algo de curioso. Entretanto estou satisfeito com a realidade do fenômeno. Como eu, muitas outras pessoas conhecem estes fenômenos, experimentando em suas próprias casas. Se você é um filósofo, pense o que quiser.”
Quando o Professor De Morgan diz que algum Espírito estava lendo seus pensamentos, deixa de observar que o incidente da primeira letra era prova de qualquer coisa que não estava em sua mente. Assim, da atitude de Mrs. Hayden durante a sessão, é claro que se tratava de sua atmosfera e não de sua atual personalidade consciente. Outras provas importantes de De Morgan vão para o Apêndice.
Mrs. Fitzgerald, a conhecida figura dos primeiros tempos do Espiritismo em Londres, publica no The Spiritualist de 22 de novembro de 1878, a notável experiência feita com Mrs. Hayden, que damos a seguir:
“Meu primeiro contacto com o Espiritismo se deu há trinta anos, quando da primeira visita a este país feita pela conhecida médium, Mrs. Hayden. Fui convidada a vê-la numa reunião dada por uma amiga em Wimpole Street, em Londres. Tendo antes assumido para aquela tarde um compromisso que não podia cancelar, cheguei atrasada, depois de uma cena extraordinária, da qual todos falavam animadamente. Meu olhar de desapontamento foi notado e Mrs. Hayden, que então encontrava pela primeira vez, adiantou-se muito bondosa, exprimindo o seu pesar e sugerindo que me sentasse a uma mesinha, separada das outras pessoas, e que iria pedir aos Espíritos que se comunicassem comigo. Tudo isso era tão novo e surpreendente que eu quase não compreendia o que ela estava dizendo ou o que eu devia esperar. Ela colocou um alfabeto impresso à minha frente, um lápis e uma folha de papel.
Enquanto isto fazia, senti extraordinariamente as batidas sobre a mesa, cujas vibrações me atingiam a planta do pé, apoiado sobre o pé da mesa. Então ela me ensinou a anotar cada letra indicada por uma batida distinta e, com essa simples explicação, deixou-me entregue a mim mesma. Indiquei, como desejava, e uma batida distinta marcou a letra E; outras se seguiram até formarem um nome que eu não podia ignorar. Foi dada a data da morte, que eu ignorava e acrescendo uma mensagem que trouxe à minha memória as últimas fracas palavras de uma velha amiga, a saber: “Velarei por ti!” Então se desenhou vivamente em minha memória a lembrança de toda a cena. Confesso que fiquei estupefata e algo aterrada.
Levei o papel no qual tudo isso fora escrito e ditado pelo Espírito de minha amiga ao seu último procurador e ele me garantiu que as datas, etc., estavam perfeitamente corretas. Não tinham ficado em minha mente porque eu não me tinha preocupado com elas.”
É interessante notar que Mrs. Fitzgerald declara que supunha que a primeira sessão de Mrs. Hayden em Londres tinha sido feita com Lady Cambermere, seu filho, o Major Cotton, e Mr. Henry Thompson, de York.
No mesmo volume de The Spiritualist, à página 264, aparece o relato de uma sessão com Mrs. Hayden, realizada em vida de Charles Young, o conhecido ator trágico, escrito por seu filho, o Reverendo Julian Young:
“19 de Abril de 1853. Neste dia fui a Londres com o propósito de consultar meus advogados sobre assunto de importância para mim e, tendo ouvido falar muito de uma Mrs. Hayden, senhora americana e médium espírita, desde que me achava na cidade resolvi descobri-la e avaliar os seus dons por mim mesmo. Acidentalmente encontrei um velho amigo, Mr. H., a quem pedi o endereço dela. Disse-me ele que era em 22, Queen Street, Cavendish Square. Como ele jamais a tinha visto e desejava vê-la, mas não queria gastar um guinéu para isto, convidei-o para ir comigo. Aceitou com satisfação. As batidas de espíritos tornaram-se tão comuns em 1853 que eu abusaria da paciência do leitor se fosse descrever a maneira convencional de comunicação entre vivos e mortos. Desde a data acima tenho assistido muito a batidas de Espíritos; e, conquanto meus órgãos da imaginação sejam muito desenvolvidos, e eu tenha um fraco pelo místico e pelo sobrenatural, ainda não posso dizer que haja testemunhado qualquer fenômeno espírita que não possa ser explicado por meios naturais, exceto o caso que vou relatar, no qual qualquer conluio parece afastado, pois o amigo que me acompanhava jamais tinha visto Mrs. Hayden e ela nem sabia o seu nome nem o meu. Entre mim e Mrs. Hayden travou-se o seguinte diálogo:
Mrs. H.: – O senhor deseja comunicar-se com algum amigo já falecido?
J. C. Y.: – Sim.
Mrs. H.: – Então tenha a bondade de fazer perguntas na maneira indicada na fórmula e eu lhe digo que obterá respostas satisfatórias.
J. C. Y. (Dirigindo-se a um invisível que admitia estivesse presente): – Diga-me o nome da pessoa com quem desejo comunicar-me.
As letras foram marcadas por batidas à medida que eram pronunciadas e formaram o nome de George William Young.
– Em quem estão fixados os meus pensamentos?
– Frederick William Young.
– De que sofre ele?
– Tic doloroso.
– Pode indicar alguma coisa para ele?
– Enérgico mesmerismo.
- Quem lho poderia administrar?
– Alguém que tivesse grande simpatia com o paciente.
– Eu teria êxito?
– Não.
– Quem teria?
– Joseph Ries.
Era um rapaz a quem meu tio respeitava.
– Perdi algum amigo recentemente?
– Sim.
– Quem?
Eu estava pensando em Miss Young, uma prima longe.
– Christiana Lane.
– Pode dizer onde dormirei esta noite?
– Em casa de James B, 9, Clarges Street.
– Onde dormirei amanhã?
– Na casa do Coronel Weymonth, em User Grosvenor Street.
Eu estava tão assombrado com a exatidão das respostas dadas as minhas perguntas que disse ao senhor que estava comigo que desejava fazer algumas perguntas íntimas, que ninguém deveria ouvir e, assim, me via obrigado a lhe pedir que passasse à sala vizinha por alguns minutos. Isto posto, retomei o diálogo com Mrs. Hayden.
– Levei o meu amigo a afastar-se porque não desejo que ele saiba da pergunta que desejo fazer; mas, também, estou ansioso por que a senhora também não a saiba e, se bem compreendo, nenhuma resposta me pode ser dada senão por intermédio da senhora. Em tais circunstâncias, como deveremos proceder?
– Faça a sua pergunta de maneira que a resposta possa ser dada por uma palavra que focalize a idéia que o senhor tem em mente.
– Tentarei. Realizar-se-á aquilo que me ameaça?
– Não.
– Isto não satisfaz. É fácil dizer sim ou não, mas o valor da afirmação ou da negação dependerá da convicção que tenho de que a senhora saiba em que estou pensando. Dê-me uma palavra que mostre que a senhora tem a pista dos meus pensamentos.
– Testamento.
– Na verdade, um testamento pelo qual eu seria beneficiado estava ameaçado de contestação. Eu desejava saber se a ameaça seria levada a efeito. A resposta recebida era correta”.
Deve notar-se que Mr. Young, antes ou depois da sessão, não acreditava na manifestação dos Espíritos e que, certamente, depois dessa experiência, a assimilação de novos conhecimentos não depõe muito em favor de sua inteligência ou de sua capacidade.
A seguinte carta de Mr. John Malcolm, de Clifton, Bristol, publicada em The Spiritualist, menciona como são os assistentes pessoais muito conhecidos. Discutindo a questão levantada: onde teria sido realizada a primeira sessão na Inglaterra e quem a teria assistido, diz ele:
“Não me lembro da data; mas, visitando a minha amiga Mrs. Crowe, autora de “The Night Side of Nature” esta me convidou para acompanhá-la a uma sessão espírita em casa de Mrs. Hayden, em Queen Anne Street, Cavendish Square. Informou-me que Mrs. Hayden acabava de chegar da América para exibir os fenômenos espíritas ao povo da Inglaterra, que deveria interessar-se pelo assunto. Estavam presentes Mrs. Crowe, Mrs. Milner Gibson, Mr. Collej Grattan, autor de “High Ways and Bye Ways”, Mr. Robert Chambers, Doutor Daniel, Doutor Samuel Dickson e muitos outros cujos nomes não ouvi.
Algumas manifestações notabilíssimas ocorreram nessa ocasião. Posteriormente tive oportunidade de visitar Mrs. Hayden e, conquanto de início inclinado a duvidar da autenticidade dos fenômenos, tive prova tão evidente da comunicação dos Espíritos que me tornei um firme crente nessa verdade”.
Na imprensa inglesa desencadeou-se furiosa luta. Pelas colunas do jornal londrino Critic, Mr. Henry Spicer, autor de “Sights and Sounds”, respondia às críticas do Household Worlds, do Leader e do Zoist. Seguiu-se no mesmo jornal uma longa contribuição de um clérigo de Cambridge, que usava as iniciais M. A., e que era admitido como sendo o Reverendo A. W. Hobson, do St. John’s College, de Cambridge.
A descrição desse cavalheiro é forte e expressiva, mas demasiadamente longa para ser transcrita. A questão é de alguma importância, na opinião do autor, por se tratar do primeiro clérigo inglês interessado no assunto. É estranho e, talvez, característico da época, quão pouco as consequências religiosas chocaram os vários assistentes e como ficaram eles inteiramente absorvidos em saber o segundo nome da avó ou o número de seus tios. Mesmo os mais zelosos faziam perguntas fúteis e ninguém demonstrava haver compreendido as reais possibilidades de um tal intercâmbio ou que se poderia estabelecer uma base firme para a crença religiosa. Contudo aquele clérigo, de maneira acanhada, viu o lado religioso da questão. E termina o seu relato com este parágrafo:
“Concluo em poucas palavras aos numerosos leitores clericais de Critic. Como clérigo da Igreja da Inglaterra, considero este um assunto ao qual meu irmão sacerdote deve, mais cedo ou mais tarde, demonstrar interesse, por mais relutante que seja em se dedicar a ele. E minhas razões, em poucas palavras, são as seguintes: Se um tal interesse se generalizar neste país, como já aconteceu na América, – e que razões temos nós para não o admitir? – então o clero de todo o reino a ele será chamado de todos os lados, terá que dar a sua opinião e provavelmente será obrigado, por seus mesmos deveres, a interferir e a evitar as mistificações a que, em muitos casos, o mistério conduziu. Um dos mais sensíveis e hábeis escritores sobre as manifestações espíritas na América, como por exemplo Adin-Ballou, em seu trabalho advertiu os leitores que não acreditassem em todos os Espíritos que se comunicam, nem mudassem de opinião nem de crença, como tem sido feito aos milhares, influenciados por estas batidas. A coisa apenas começou na Inglaterra; mas em poucos meses, desde que o casal Hayden chegou a Londres, espalhou-se como fogo na floresta e tenho boas razões para dizer que o entusiasmo apenas se acha em começo. Pessoas que de início consideraram a coisa como impostura e mistificação, testemunhando elas próprias os fenômenos, a princípio ficaram chocadas e atônitas, depois aceitaram cegamente as mais loucas conclusões – como, por exemplo, que tudo é trabalho do demônio ou, em sentido contrário, que há uma revelação do Céu. Vejo muitas pessoas capazes e inteligentes, terrível e completamente mistificadas. E ninguém sabe o que fazer. De minha parte apresso-me a confessar que também me sinto mistificado. De que não é impostura estou absoluta e perfeitamente convencido. Além dos testes acima referidos, tive uma longa conversa com Mr. Hayden e sua senhora, separadamente, e tudo quanto me disseram tinha a marca de sinceridade e boa fé. Aliás isto não constitui prova para outros, mas apenas para mim. E se engano existe, tão enganados estão eles quanto as suas vítimas.”
Não foi o clero, mas os livres-pensadores que perceberam a verdadeira significação da mensagem, e que ou deviam lutar contra essa prova da vida eterna ou deviam confessá-la honestamente, como tantos de nós o fizemos desde então, que a sua filosofia estava estraçalhada e que eles tinham sido batidos no seu próprio campo. Esses homens tinham pedido provas em questões transcendentes e os mais honestos e argutos foram forçados a admitir que as tinham tido. O mais nobre de todos eles foi Robert Owen, tão famoso por seus trabalhos humanitários como por sua atrevida independência em questões religiosas. Esse homem corajoso e honesto declarou publicamente que os primeiros raios desse sol nascente o tinham ferido e haviam dourado o sombrio futuro que ele imaginava. Diz ele:
“Tracei pacientemente a história dessas manifestações, investiguei os fatos a elas ligados, em numerosos casos testemunhados por pessoas de grande caráter, tive catorze sessões com a médium Mrs. Hayden, durante as quais ela me deu todas as oportunidades para verificar, quando possível, se poderia ter havido qualquer mistificação de sua parte.”
“Não só me convenci de que não havia mistificação, com médiuns fidedignos nesses processos, mas que os mesmos estão destinados, no atual período, a realizar a maior revolução moral no caráter e nas condições da raça humana.”
Mrs. Emma Hardinge Britten comenta o interesse e a admiração produzida pela conversão de Robert Owen, cuja influência, puramente materialista, era tida como exercendo um efeito prejudicial sobre a religião. Diz ela que um dos mais preeminentes estadistas ingleses dizia que “Mrs. Hayden merecia um monumento, quando mais não fosse, pela só conversão de Robert Owen”.
Pouco depois o famoso Doutor Elliotson, presidente da secular sociedade, foi convertido, como São Paulo, depois de violento ataque à nova revelação. Ele e o Doutor Ashburner tinham sido os mais preeminentes defensores do mesmerismo naqueles dias em que esse indiscutível fenômeno tinha que lutar por sua existência e quando cada médico que o apoiava estava arriscado a ser chamado de charlatão. Foi penoso para ambos, porque enquanto o Doutor Ashburner se atirava entusiasmado nessas altas cogitações, seu amigo se via compelido não só a repeli-lo, mas a atacá-lo. Contudo, a divergência foi liquidada pela completa conversão de Elliotson; e Mrs. Hardinge Britten relata como, em seus últimos dias, ele insistia para que ela viesse vê-lo e como o encontrou como “um fervoroso adepto do Espiritismo, uma fé que o venerando senhor amava como a mais brilhante revelação, que jamais o havia iluminado e que, finalmente, suavizando a escura passagem para o Além da Morte, havia feito dessa transição uma cena de fé triunfante e de sorridente antecipação”.
Como era de esperar, não demorou muito para que o rápido desenvolvimento dos fenômenos das mesas obrigasse os cientistas cépticos a lhes reconhecer a existência ou, pelo menos, tentar demonstrar o engano dos que atribuíam os movimentos a uma causa externa. Braid, Carpenter e Faraday sustentavam publicamente que os resultados obtidos eram devidos apenas a uma ação muscular inconsciente. Faraday imaginou instrumentos engenhosos por meio dos quais tinha comprovada a sua assertiva. Mas, como muitos outros críticos, não tinha feito experiências com um bom médium e o fato muito bem constatado do movimento de mesas sem contacto era suficiente para desmoronar as suas teorias. Se se pudesse imaginar um leigo sem telescópio a contradizer um astrônomo, que o tivesse usado, teríamos uma analogia para essa gente que se aventura a criticar assuntos psíquicos sem jamais ter feito experiências psíquicas.
Foi Sir David Brewster quem exprimiu o estado de ânimo daquela época. Falando de um convite de Monckton Milnes para encontrar-se com Mr. Galla, o explorador africano “que lhe havia assegurado que Mrs. Hayden lhe havia dito nomes de pessoas e lugares da África que ninguém, a não ser ele, podia saber”, comenta Sir David: “É fora de dúvida que o mundo está ficando maluco”.
Mrs. Hayden ficou cerca de um ano na Inglaterra, tendo voltado para a América em fins de 1853. Um dia, quando estas questões tiverem a sua verdadeira proporção, em relação a outros acontecimentos, sua visita será considerada como um acontecimento histórico marcante. Dois outros médiuns americanos estiveram na Inglaterra durante a sua visita: Mrs. Roberts e Miss Jay; seguiram-na pouco depois, mas parece que tiveram pouca influência no movimento e que lhe foram inferiores em força psíquica.
Um quadro daqueles primeiros dias é dado por um resumo de um artigo sobre o Espiritismo, publicado a 25 de outubro de 1856 no The Yorkshireman, jornal não espírita:
“Pensamos que, em geral, o público inglês não conhece a natureza das doutrinas espíritas e, sem dúvida, muitos dos nossos leitores certamente não se acham preparados para pensar que elas prevaleçam, até certa extensão, em nosso país. Os fenômenos comuns de movimento de mesas, etc., na verdade são familiares a muita gente. Há cerca de dois ou três anos não havia uma reunião noturna que não tentasse a realização de um milagre espírita... Naqueles dias a gente era convidada para “chá e mesas girantes”, como um novo divertimento e tinha que se mexer com toda a família, em volta dos móveis, como loucos”.
Depois de afirmar que o ataque de Faraday “tinha espantado os Espíritos”, de modo que por algum tempo não mais se ouvia falar das suas atividades, acrescenta o jornal:
“Contudo temos provas amplas de que o Espiritismo, como uma crença vital e ativa, não está circunscrito aos Estados Unidos, mas encontrou favor e aceitação entre um considerável número de entusiastas em nosso país.”
Mas a atitude geral da imprensa mais influente foi muito semelhante à atual: ridículo e negação dos fatos e o ponto de vista que, mesmo quando os fatos fossem verdadeiros, para que serviriam? The Times, por exemplo, um jornal muito mal informado e reacionário sobre assuntos psíquicos, num artigo de fundo, pouco depois dessa data, sugere:
“Seria algo como tomar o nosso chapéu do cabide por um esforço de vontade, sem ir pegá-lo ou ocupar um criado.
“Se a força da mesa pudesse ser aplicada ao menos para acionar uma máquina de moer café ganharíamos alguma coisa.
“Seria melhor que os nossos médiuns, em vez de indagar de que morreu alguém há cinquenta anos, descobrissem as cotações da bolsa daqui a três meses”.
Quando a gente lê tais comentários num grande jornal, fica a pensar se realmente esse movimento não foi prematuro e se, numa época tão baixa e material, não seria impossível fixar a idéia de uma intervenção exterior. Entretanto a maior parte dessa intervenção era devida à frivolidade dos investigadores que ainda não haviam compreendido a inteira significação desses sinais do Além e os empregava, como assinala o jornal de Yorkshire, como uma espécie de divertimento social e uma nova excitação para uma mundanidade fatigada.
Mas enquanto, na opinião da imprensa, um golpe mortal havia sido dado no desacreditado movimento, a investigação prosseguia silenciosamente em muitos lugares.
Gente sensata, segundo indica Howitt, “estava com êxito experimentando aqueles anjos, na sua mesma forma de apresentação e verificando que eram reais” pois, como diz muito bem, “os médiuns públicos jamais fizeram mais do que inaugurar o movimento”.
Se tivéssemos que julgar pelo público testemunho da época, a influência de Mrs. Hayden deveria ser considerada como de pouca extensão. De um modo geral, para o público era ela uma maravilha fugaz; mas espalhou muita semente que germinou lentamente. O fato é que abriu o assunto e o povo, na maioria nos mais baixos degraus da vida, começou a experimentar e a descobrir a verdade por si mesmo; embora com as cautelas filhas da experiência, tomou a maior parte dessas experiências para si próprio. É fora de dúvida que Mrs. Hayden desempenhou a sua missão.
A história do movimento bem pode ser comparada a um mar que avança em ondas sucessivas, cada vez maiores. Cada onda era tomada pelo observador como sendo a última, até que surgisse uma nova vaga. O tempo decorrido entre a partida de Mrs. Hayden em 1853 e o aparecimento de D. D. Home em 1855 representa o primeiro repouso na Inglaterra. Os críticos superficiais pensavam que era o fim. Mas em milhares de casas em todo o país realizavam-se experiências; muitos dos que haviam perdido completamente a fé nas coisas do espírito, naquilo que era talvez o mais material período da história do mundo, tinham começado a examinar as provas e a compreender com alívio ou com espanto que estava passando a idade da fé, e que o período do conhecimento, que São Pedro havia dito ser melhor, estava se aproximando. Dedicados estudantes das Escrituras recordam as palavras do Mestre: “Eu tenho ainda muitas coisas que vos dizer; mas vós não as podeis suportar agora.” e pensavam se esses estranhos movimentos de forças exteriores não fariam parte daquele novo conhecimento que havia sido prometido.
Enquanto Mrs. Hayden havia plantado as primeiras sementes em Londres, uma segunda onda de acontecimentos tinha trazido os fenômenos espíritas ao alcance do povo de Yorkshire. Isto se deveu à visita de um certo Mr. David Richmond, um shaker americano, à cidade de Keighley, quando procurou Mr. David Weatherhead e o interessou no novo desenvolvimento. Foram obtidas manifestações de mesa e descobertos médiuns locais, de modo que se organizou um centro florescente, que ainda existe. De Yorkshire o movimento ganhou o Lancashire e formou uma interessante cadeia com o passado, essa formada por Mr. Wolstenholme, de Blackburn, falecido em 1925, em idade provecta e que, quando garoto, escondeu-se debaixo de uma mesa numa dessas primeiras sessões, de onde testemunhou os fenômenos, embora pensemos que não os tenha auxiliado. O jornal The Yorkshire Spiritual Telegraph apareceu em Keighley em 1855, e suas despesas, bem como outras, foram cobertas por David Weatherhead, cujo nome deveria ser venerado como um dos primeiros a entregar-se de corpo e alma no movimento. Keighley é ainda um centro ativo de trabalho e de estudos psíquicos.



Sites interessantes (em inglês)
1) http://www.emmahardinge.net/original/emma43.htm
2) http://www.psychics.co.uk/spiritualism/history_of_spiritualism.htm